Após conhecidas as quatro acusações contra Donald Trump, ao longo dos últimos cinco meses, as datas em que o ex-Presidente dos Estados Unidos responderá em julgamento surgem em catadupa. Ao mesmo tempo, alguns co-acusados aparentam cooperar com as autoridades, atitude que pode provocar um choque de interesses.
Referente à alegada tentativa de golpe de Estado, que culminou na invasão do Capitólio a 6 de janeiro de 2021, o julgamento ficou ontem marcado para 4 de março, mais de dois anos antes da sugestão avançada pelos representantes legais do magnata (abril de 2026).
Antes disso, reservaram-se as datas de 25 de março e de 4 de maio para as idas a tribunal nos casos relativos, respetivamente, ao suborno de um atriz pornográfica, em Nova Iorque, e retenção ilegal de material ultra-secreto, na Florida.
No que concerne ao caso de Washington D.C., contrariamente à lentidão desejada pelos causídicos de Trump, o procurador especial Jack Smith ambicionava que o julgamento se realizasse já em janeiro, coincidindo com aniversário da rebelião.
“As propostas em causa distanciam-se bastante. Nenhuma delas é aceitável”, concluiu a juíza responsável pelos trabalhos, Tanya Chutkan, acrescentando que a escolha “nunca poderia depender das obrigações pessoais ou profissionais do acusado”. O julgamento começará um dia antes da “super-terça-feira”, o momento principal das primárias, onde Trump permanece como favorito à nomeação republicana.
Note-se, também, que Chutkan recordou a teia de processos que envolve Trump, sugerindo que teve em conta isso mesmo aquando da marcação. “Tive perfeita noção das acusações noutros estados, assim como na Justiça federal”.
“Sem um processo eleitoral consolidado, as democracias morrem”
Prova dessa mesma complexidade legal, com consequências para o calendário político dado que as primárias começam em fevereiro, decorria, à mesma hora, uma audiência no condado de Fulton, Geórgia.
Ali, o líder conservador foi indiciado há três semanas com outros 18 indivíduos por “tentativa de manipulação da contagem dos votos” depois das eleições de novembro de 2020. Com esse intuito, Trump terá praticado 13 crimes, entre os quais “extorsão”, “associação criminosa” e “conspiração”.
Ontem, o multimilionário ficou a saber que a leitura da acusação ocorrerá a 6 de setembro, às 9h30 locais (14h30 em Portugal continental). A sua presença não será obrigatória, assim como a de nenhum outro indiciado.
“O caso em Washington D.C. será porventura aquele mais mediatizado, visto que reporta ao dia em que a nossa democracia esteve por um fio”, afirma ao Expresso Glenn Kirschner, antigo procurador federal no distrito de Washington D.C. “Contudo, o caso na Geórgia revela, claramente, que Trump e os seus amigos associaram-se com o intuito de pôr em causa a segurança do processo eleitoral, baseando-se em teorias da conspiração que, diga-se, foram arrasadas em mais de 60 tribunais estaduais e federais”.
Segundo Kirschner, as práticas alegadas pelos responsáveis daquele estado do sul “deveriam alarmar a população americana”, visto que “sem um processo eleitoral consolidado, as democracias morrem”.
Eventualmente consciente desse facto, Mark Meadows, antigo chefe de gabinete de Trump e um dos 19 acusados pela procuradoria do condado de Fulton, foi interrogado esta segunda-feira sobre o seu papel na tentativa de alterar os resultados das presidências de 2020.
Ao longo de quatro horas, assegurou que as alegadas pressões sobre testemunhas e autoridades locais “enquadravam-se” no exercício do seu cargo. “Dada a minha posição, participei em quase todas as reuniões que o presidente teve com responsáveis da Geórgia. Em muitas delas, fui um mero observador”, salientou. “Noutras alturas, as pessoas reuniam-se comigo apenas para me pedir que passasse certas mensagens ao presidente”.