Internacional

Juíza federal dá cinco dias a Bolsonaro para se pronunciar sobre as comemorações do golpe militar

Decisão de Jair Bolsonaro de comemorar o golpe militar que deu início à ditadura militar em 1964 foi alvo de críticas e ações judiciais e foram dados cinco dias ao Presidente brasileiro para dizer exatamente o que pretende fazer. Prazo poderá ser, no entanto, demasiado alargado para que possa haver uma decisão antes de domingo, dia em que se assinalam precisamente os 55 anos desde o golpe

EVARISTO SA/GETTY IMAGES

O Governo brasileiro anunciou que pretende comemorar o golpe militar no Brasil de 1964, que deu início à ditadura militar no país, foram interpostas duas ações judiciais contra isso e agora Jair Bolsonaro, Presidente do país, é chamado a explicar o que pretende exatamente fazer. Tem cinco dias para isso, conforme determinou uma juíza federal de um tribunal de Brasília.

Depois de o Governo ter anunciado, através de Otávio Rêgo Barros, porta-voz de Bolsonaro, que pretendia assinalar os 55 anos desde o golpe militar que depôs o então Presidente brasileiro João Goulart, a Defensoria Pública da União, instituição pública que dá apoio jurídico gratuito a quem não possa pagar por ele, e o advogado Carlos Alexandre Klomfahs, conhecido por ter movido uma ação popular que veio suspender um aumento dos impostos determinado por Michel Temer em 2017, interpuseram ações judiciais contra a realização das comemorações. A juíza federal Irani Silva da Luz, de um tribunal de Brasília, deu cinco dias a Bolsonaro para se pronunciar sobre o assunto mas, e face ao prazo dado, é “improvável” que haja uma decisão antes do próximo domingo, 31 de março, quando se assinalam precisamente os 55 anos do golpe militar, diz a “Folha de São Paulo”.

A Defensoria Pública da União argumentou que a iniciativa de Bolsonaro é uma ofensa “à memória de todas as pessoas que foram perseguidas, torturadas e assassinadas durante a ditadura brasileira”, além de violar “profundamente” aquilo que é descrito como a “moralidade administrativa nacional”, e que tem que ver com o uso de verbas públicas. Segundo esta ação judicial em específico, a decisão de Bolsonaro constitui ainda uma violação de uma lei específica brasileira, segundo a qual as datas comemorativas que vigorem em todo o território nacional deve ser objeto de um projeto de lei.

O anúncio feito na quarta-feira por Otávio Rêgo Barros no decurso de uma conferência de imprensa no Palácio do Planalto, em Brasília, careceu de grandes explicações. O porta-voz limitou-se a dizer que Bolsonaro não vê a tomada de poder pelos militares em 1964 — que deu início a um período marcado por uma intensa repressão e tortura, e perseguição de adversários políticos e outros opositores — como um “golpe”. Vê, antes “como uma decisão tomada pela sociedade face ao perigo que a ameaçava” e que permitiu “recuperar e voltar a colocar o país no rumo certo”. “Se isso não tivesse acontecido, hoje não haveria um governo e isso não seria bom para ninguém”, afirmou o porta-voz.

Celebrações no interior dos quartéis

Segundo o que a “Folha de São Paulo” conseguiu apurar no próprio dia, terão sido dadas ordens para que as comemorações não decorram nas ruas e outros espaços públicos mas dentro dos quartéis do Exército. Estará prevista a leitura da ordem do dia, a organização de formaturas e a realização de palestras para os militares. Ainda de acordo com o jornal brasileiro, o Exército terá convencido Bolsonaro a realizar comemorações discretas de modo a não agravar o clima político do país e ofuscar a reforma da Previdência, considerada a prioridade do atual governo.

Além das referidas ações judiciais, um grupo de vítimas e familiares de vítimas da ditadura militar pediu ao Supremo Tribunal Federal para impedir a realização de quaisquer comemorações e proibir que seja aprovada qualquer lei presidencial que obrigue os órgãos públicos federais a assinalar o golpe militar. Se alguma tiver sido já aprovada, “então deve ficar imediatamente sem efeito”, refere ainda o grupo, segundo o qual a medida de Bolsonaro viola “o direito à memória e à verdade das vítimas da ditadura, que foram alvo de torturas e homicídios, e das suas famílias”. Uma ação popular foi também interposta pelo mesmo grupo à Justiça Federal de São Paulo, afirmando-se aí que a iniciativa do Presidente brasileiro é ilegal do ponto de vista administrativo e constitui “um atentado contra o cargo de Presidente da República”.

Também a organização não-governamental Human Rights Watch criticou a decisão de Bolsonaro de “comemorar uma ditadura brutal”. “O Presidente brasileiro critica, com razão, os governos cubano e venezuelano por violarem direitos básicos da população, mas ao mesmo tempo quer celebrar uma ditadura militar que causou um sofrimento indescritível a dezenas de milhares de brasileiros”, lê-se no comunicado divulgado pela organização, segundo a qual é “difícil imaginar um exemplo mais claro de dois pesos e duas medidas”.