Meus amigos, ultimamente tenho sido associado nos jornais a orgias gastronómicas dionisíacas, mas, apesar de reconhecer alguns excessos por parte dos membros mais jovens da minha equipa (como a Joana Baptista que, ao discutir, num almoço de negócios, o alargamento do Plano Diretor Municipal mandou castrar o empregado-de-mesa d’“Os Arcos” com a faca de peixe porque exige que os lagostins-da-rocha sejam descascados e servidos à boca por eunucos), eu próprio mudei desde que passei pela cadeia. Devido a essa rica experiência humana, hoje em dia sou uma pessoa acessível a todos, que tanto fala com os poderosos como com os humildes, ou seja, no caso do concelho de Oeiras, com um pós-doutorando ou com um simples bacharel. Após anos de hedonismo, foi na prisão da Carregueira (onde era conhecido como o recluso 721, em referência ao número do prato - o Pato à Cantonesa - que eu escolhia do menu do Mandarim, no Casino Estoril) que aprendi a abraçar a simplicidade com a comida básica, mas maravilhosa, do refeitório prisional, como o empadão feito com puré de batata desidratada e latas de atum em óleo vegetal que o Jorge Ritto, ex-embaixador em Marrocos, comparava ao tajine de peixe do “Dar Cherifa”, em Marraquexe. Ou, às quintas-feiras, os panados de peru com arroz branco que o Carlos Cruz dizia superiores ao Frango à Zambeziana que comia, em novo, no “Restinga” de Luanda. E o que dizer do red fish assado no forno, que o Vale e Azevedo considerava superior às caldeiradas do Barbas que comia quando era presidente do Benfica ou do “fish and chips” que comia no “Toff’s” de Londres, antes de ser extraditado da Inglaterra. E nem falo da inesquecível gelatina de ananás feita com aroma em pó e medula de vaca com BSE, a mesma servida na prisão de Évora, que o José Sócrates comparava às melhores sobremesas do Pierre Hermé, em Paris. Ou o salame de chocolate de fábrica servido excecionalmente no Natal, quase da grossura dos charutos cubanos que eu costumava fumar. Amigos, vocês nem sabem o esforço que faço para manter a linha nos almoços de negócios da autarquia. E é por isso que prefiro delegar o sacrifício à minha abnegada equipa, obrigada a empanturrar-se de leitão assado e champanhe com os empresários, enquanto eu, depois de uma salada leve e uma garrafinha de água das pedras, limito-me a assinar os contratos por baixo. V.E.