O timing do boicote policial à realização de jogos de futebol não foi bem ponderado. Por muito que sejamos um país obcecado pela bola, a verdade é que esta semana principiam os debates para as legislativas, uma espécie de Mundial da baixa política que substitui na plenitude o desporto-rei no que toca a emoção e drama. Só seria aborrecido suprimir um Famalicão - Sporting se não tivéssemos um IL - Livre em perspetiva.
Como no futebol, o tempo útil é problemático. À excepção dos debates entre PSD e PS, todos os duelos televisivos terão uma duração entre os 25 e os 30 minutos - encurtados pelo anti-jogo. A extensão de um episódio de uma sitcom, portanto. Ideal para ver em casal enquanto se come uma refeição à base de restos, poupando uma mensalidade da Netflix. Tal como muitos episódios de comédias leves, os debates também serão algo previsíveis, formulaicos e não alterarão substancialmente nem a narrativa dos protagonistas, nem a nossa percepção sobre a realidade. Por outro lado, ao contrário das sitcoms, este entretenimento não faz sorrir e até indispõe.
Há quem proponha que estes debates, para que se tornem verdadeiramente esclarecedores, tenham uma duração semelhante à do duelo Soares - Cunhal, de 1975. O frente-a-frente prolongou-se por três horas, 40 minutos e 52 segundos. Quem contrapõe alega que a capacidade de concentração dos dias de hoje, corrompida pelas horas que passamos a olhar para vídeos de receitas para a air fryer, já não permite um foco tão longo. Na política de 2024, a pedra de toque é o Tiktok.
O que é certo é que os comentários aos debates emitidos a seguir ao debate não ficarão muito longe das tais três horas, 40 minutos e 52 segundos. Se os debates serão mais curtos do que a relação carnal média, os debates sobre o debate continuarão com durações de sexo tântrico. Haverá comentadores a pegar ao serviço perto da uma da manhã, naquela que é uma profissão que também deveria reivindicar subsídio de risco. Risco, principalmente, de proferir - ou repetir - banalidades.
O mais provável é que, daqui a uns meses, não nos lembremos do que foi dito nestes confrontos. Mal por mal, mais vale beber. Já que os debates são pífios, que apanhemos um pifo. Dito isto, vire uma mini de cada vez que Pedro Nuno Santos começar uma frase por "não,". Beba um gin tónico de cada vez que Rui Rocha disser "cegueira ideológica". Mame um shot de absinto de cada vez que Paulo Raimundo se referir aos "problemas reais da vida das pessoas". Encharque-se com um vodka laranja de cada vez que Luís Montenegro use a palavra "competência". Trague uma caneca de hidromel de cada vez que Rui Tavares faça uma contextualização histórica. Sorva um copo de 3 de cada vez que André Ventura empunhar uma folha A4 com uma notícia que ponha em causa o adversário. E por aí fora. São 30 debates. Tenha só algum cuidado e evite estar de ressaca no dia 10 de março.