Tenho pela frente o nº 1 do Expresso, que guardo desde a sua publicação, a 6 de janeiro de 1973, com títulos a destacarem-se da imprensa habitual. Logo na 1ª página: "63 por cento dos portugueses nunca votaram". E ao longo das seguintes, outros títulos, tais como "O que a Guiné pediu e obteve em matéria de estatutos"; "A paz é um possível" - um axioma do Bispo do Porto (era então D. António Ferreira Gomes, não esqueçamos); "Não desculpemos a guerra com argumentos económicos" (em memória de José Pinto Leite). E uma pequena notícia que dava conhecimento da "ocupação da Capela do Rato".
Beneficiando da chamada "Primavera Marcelista", percebia-se de imediato a intenção de ir até onde fosse possível; se necessário, arriscando um percurso no "fio da navalha". Pouco tempo depois, recebi um amável convite do Dr. Francisco Balsemão para colaborar no Expresso, com um tema à minha escolha. Conhecíamo-nos desde fevereiro de 1965, quando ele promovera no Diário Popular uma "mesa-redonda sobre emigração", na qual participei.
"Contentar os amigos"
Alinhando no espírito de juventude do novo semanário, optei por um tema moderadamente polémico. O primeiro artigo que publiquei, em 24 de março de 1973, teve por título "Um país desarrumado". Era um inventário impiedoso da proliferação, mormente no setor público, de organismos que, face à sua dimensão reduzida, não conseguiam desempenhar com êxito as suas funções, apesar de se multiplicarem em número. E o tema não foi abandonado, ao surgirem as esperanças de um tempo novo. Três semanas depois do 25 de Abril, voltei a colaborar, com o título: "Vamos arrumar o País?" Nele se insistia nas ideias já expressas.
Quase quatro décadas depois, continua a discutir-se não só o peso do Estado na sociedade portuguesa, mas também a eficácia das instituições públicas. Sobre as causas apontadas para a "desarrumação" do país, escrevi em maio de 1974: "Não chega a determinação de silenciar os adversários; é também indispensável manter e contentar os amigos". Era uma alusão à política anterior ao 25 de abril. Mas nos nossos dias, em plena democracia, mantém-se o desiderato de contentar os amigos, agora distribuídos pelo largo espetro partidário, seja a nível nacional, regional ou autárquico.
Raul da Silva Pereira
Lisboa
- A opinião dos leitores
- Um apoio na vida pessoal e profissional, por Almor Serra
- O Expresso só à 2ª (ou mesmo à 3ª de manhã), por Santiago Macias
- Papel por todos os cantos da casa, por Margarida Cunha
- Saudades de outros tempos, por João Bernardo Lopes
- Uma pedrada no charco, por João Pinto
- O medo de contar verdades incómodas, por António Silva Carvalho
- Leitura com música, por José Rodrigues Franco
- Três ou quatro semanas de costas voltadas, por José N. Celorico
- Em busca do humor, por Maria José Azevedo
- 'Conselhos' do Expresso para negócios de família, por José Manuel Bastos