Em 10 anos, a Inteligência Artificial (IA) poderá levar à perda líquida de 80,3 mil empregos em Portugal, que se traduzem na automatização de 481 mil postos de trabalho e na criação de 400 mil. As contas constam de um estudo sobre o impacto da IA no mercado de trabalho português, divulgado esta sexta-feira pela consultora de recrutamento Randstad. Comércio e indústrias transformadoras concentram maior fatia de funções potencialmente automatizadas.
O estudo da consultora tem por base um inquérito realizado durante o mês de fevereiro de 2024 a uma amostra de 160 empresas e 505 profissionais em Portugal. Os dados antecipam um cenário de perda líquida de 80,3 mil empregos no horizonte de 10 anos, resultado do impacto das alterações introduzidas pela IA em Portugal.
“Num curto espaço de tempo, a inteligência artificial está a transformar a forma como trabalhamos com impacto direto em diversos setores de atividade”, realça Isabel Roseiro, porta-voz da Radstad Portugal. E destaca ainda que "a sua utilização tem também efeitos sócio-económicos nomeadamente no que diz respeito ao potencial de ganhos de eficiência, o facto de algumas empresas e trabalhadores poderem beneficiar desta nova tecnologia, mas também a possibilidade de outros perderem os seus empregos com a automatização de tarefas”.
Funções financeiras, comerciais e de operações entre as que podem ser automatizadas
E a estimativa da consultora aponta para a automatização de 481 mil postos de trabalho no país até 2034. O impacto da destruição de emprego será sobretudo notório nas tarefas com maior utilização de linguagem. No estudo realizado a Randstad constituiu vários grupos, em função do grau de exposição à IA e concluiu que funções profissionais como finanças, vendas, operações, recursos humanos, marketing ou área jurídica são as que apresentam o mais alto grau de automatização e atualização, tendo, por isso, um maior grau de exposição aos avanços da tecnologia.
Em contrapartida, os dados mostram que a expansão da IA nas empresas deverá criar novas oportunidades económicas, novas profissões e empregos. Contas feitas, a Randstad aponta para a criação de 400 mil de novos postos de trabalho, que não existem atualmente, resultado da IA.
“As previsões para a economia portuguesa colocam no topo dos empregos atuais que poderiam estar em risco os setores das atividades administrativas e das atividades informáticas e telecomunicações, que poderiam ter potencialmente 18% e 17% dos seus processos automatizados”, sustenta o estudo.
Por outro lado, os setores em que se espera o maior efeito, em termos percentuais, do referido processo de criação de emprego serão as atividades informáticas e telecomunicações (29% dos novos postos de trabalho) e as atividades de consultoria, científicas e técnicas (14%). Relativamente ao aumento de produtividade estimado, a Randstad realça que “serão os setores das atividades financeiras e de seguros e das atividades informáticas e telecomunicações (36%), seguido das atividades de consultoria, científicas e técnicas (27%)”.
Trabalhadores ainda não possuem as competências necessárias para usar IA
A análise da Randstad mostra ainda que 62% das empresas portuguesas já experimentaram IA, sobretudo para análise de dados, otimização de tarefas administrativas ou de processos. Ainda assim, 37,3% das empresas inquiridas no estudo - na sua maioria grandes empresas com mais de 250 trabalhadores - ainda não incorporaram a IA em nenhuma das suas atividades.
Segundo a consultora, e tendo por base as respostas obtidas, a justificar a não utilização desta tecnologia está o facto de a IA estar num estado de adaptação recente, apresentando ainda problemas, como a falta de precisão ou qualidade das respostas (outputs).
Em paralelo, aponta o estudo, “os colaboradores não possuem as competências necessárias para a utilizar e as empresas não encontram aplicações que lhes permitam ser mais produtivos”. Um dos pontos críticos identificados na análise foi precisamente o facto de as empresas que introduziram a IA em alguns dos seus processos terem enfrentado desafios em termos de competências das suas equipas. "Em 75,8% dos casos, a importância de ter competências tecnológicas especializadas entre os seus trabalhadores aumentou. E, em muitos casos, a importância de outras competências não tecnológicas, que podem complementar estas últimas, também aumentou”, sublinha Isabel Roseiro.
A consultora aponta que as expetativas das empresas quanto ao potencial da IA são elevadas. Cerca de 72% das organizações inquiridas no estudo admite que esta tecnologia irá impulsionar a atividade no seu sector e 82,9% espera melhorias na sua própria produtividade.
Já do lado dos trabalhadores, considerando o receio do impacto da IA no seu posto de trabalho, apenas 13,7% dos inquiridos estão muito preocupados com a possibilidade de perderem o emprego no horizonte de 12 meses em resultado da adoção da IA. A percentagem aumenta para 24,8% quando o horizonte temporal é alargado para cinco anos. Num horizonte de dez anos, 38,2% dos profissionais admitem elevada preocupação com a perda de emprego.
Dados recentes do Goldman Sachs antecipam que 18% do trabalho mundial poderia ser automatizado pela IA, principalmente nas economias desenvolvidas, impacto que poderia conduzir a um aumento da produtividade e, consequentemente, do PIB mundial anual em 7%.