A Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, remeteu para o Tribunal Constitucional um pedido de fiscalização das alterações ao Código do Trabalho em duas normas concretas: a que impõe limitações ao recurso a terceirização de serviços ('outsourcing') por empresas que tenham realizado despedimentos coletivos ou por extinção de posto de trabalho nos 12 meses anteriores e a que concede a certos prestadores de trabalho o poder de se fazerem temporariamente substituir através de terceiros por si indicados. Maria Lúcia Amaral pede que seja declarada a inconstitucionalidade de ambas as normas, alegando que “estas estabelecem restrições ao direito fundamental de iniciativa económica privada" e que não observam a exigência de proporcionalidade decorrente do artigo 18.º da Constituição.
As novas regras entraram em vigor em maio, mas o argumento de inconstitucionalidade já ecoava há meses, ainda o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, não tinha promulgado as alterações ao Código do Trabalho, no âmbito da Agenda para o Trabalho Digno, quer junto das confederações empresariais, quer junto dos advogados. Cinco meses depois, a Provedora de Justiça acompanha-os nas críticas.
O travão ao outsourcing ainda durante a discussão em sede de concertação social uma das normas mais polémicas e contestadas pelos patrões, que desde o primeiro minuto defenderam a sua inconstitucionalidade, pela ‘intromissão’ que a norma vinha impor à liberdade de gestão empresarial. Na prática, revisão legislativa aprovada e atualmente em vigor impede o recurso ao outsourcing – terceirização ou externalização de serviços - por empresas que tenham realizado despedimentos coletivos ou por extinção de posto de trabalho nos 12 meses anteriores.
As confederações chegaram a levar o tema ao Presidente da República, a quem pediram que travasse a promulgação da lei, sustentando-o com um parecer jurídico, mas sem sucesso. Marcelo acabaria por promulgar o diploma, mas não sem antes alertar para os seus riscos. É esta mesma norma, uma das que provedora de Justiça quer ver declarada inconstitucional.
Limitações ao outsourcing são desproporcionais
Numa carta enviada ao presidente do Supremo Tribunal Constitucional, a Provedora de Justiça fundamenta o pedido de inconstitucionalidade da norma inscrita no artigo nº 338-A, nº1 e 2º, com o argumento de que o recurso à terceirização “faz parte integrante das faculdades de escolha que se incluem no âmbito do exercício da liberdade de iniciativa económica privada“. Destacando que a intenção do legislador seria a de reforçar a garantia de segurança no emprego, Maria Lúcia Amaral vinca que “não se vê como é que esta restrição [de recurso ao outsourcing] pode ser justificada, de acordo com as exigências de proporcionalidade”.
A Provedora de Justiça entende que “não é pensável o exercício da liberdade de empresa - entendida como liberdade de gestão ou direção da atividade económica já iniciada - sem liberdade de contratual”. Liberdade essa que, pela sua definição, aponta a provedora, “o poder de escolher a forma jurídica de organização da empresa, o poder de escolher os serviços necessários ao seu funcionamento, o poder de escolher os trabalhadores que passarão a integrar a estrutura empresarial, o poder de escolher os demais prestadores de trabalho, cujas prestações se contratam”. Razão pela qual, entende que a Lei, tal como está, impõe restrições a este direito.
Ameaça à liberdade contratual
E esta não é a única norma que Maria Lúcia Amaral considera ferida de inconstitucionalidade. Em causa está também o número 3 do artigo 10º do Código do Trabalho que determina que um prestador de trabalho possa fazer substituir-se, temporariamente, por terceiros por si indicados na prestação do serviço.
Entende a Provedora de Justiça que também aqui está ameaçada a liberdade contratual: “a faculdade de escolha comprime-se intensamente ao obrigar o credor da prestação de trabalho a aceitar que a referida prestação seja realizada por outrem que não a contraparte por si escolhida”, argumenta Maria Lúcia Amaral no requerimento que remete ao Tribunal Constitucional.
Tanto no caso do outsourcing, como na norma que permite ao prestador fazer-se substituir por terceiros, a Provedora de Justiça, entende que as normas “estabelecem restrições ao direito fundamental de iniciativa económica privada que não observam a exigência de proporcionalidade decorrente do artigo 18.º da Constituição” e fundamenta assim o seu pedido de que sejam consideradas inconstitucionais.