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Estado compra participações da Global Media e da Páginas Civilizadas na Lusa

Negócio foi concretizado esta quarta-feira por quase 2,5 milhões de euros, labaixo do valor que tinha sido definido no ano passado. Global apenas recebe cerca de 268,8 mil euros devido à dívida de um milhão de euros paga à agência de notícias. Estado fica com quase 96%

O Governo concretizou esta quarta-feira a compra das participações da Global Media e da sua acionista maioritária Páginas Civilizadas no capital da Lusa. As duas empresas detinham 45,71% da agência de notícias, 23,36% eram da Global Media e 22,35% da Páginas Civilizadas.

O negócio foi concretizado por 2,497 milhões de euros, correspondendo 1,3 milhões à Global e 1,22 milhões à Páginas Civilizadas. No caso da Global, é descontada a dívida à Lusa, no valor de 1 milhão de euros, o que significa que a empresa apenas receberá 268,6 mil euros.

Desta forma, o Estado português, que detinha 50,15% através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF), passa a ter a quase totalidade do capital da Lusa, cerca de 96%. Os restantes acionistas privados da Lusa são a NP Notícias de Portugal com 2,72%, Público Comunicação Social (1,38%), e a Empresa do Diário do Minho (0,01%). A RTP tem 0,03%.

O negócio ocorre depois de esta terça-feira ter sido concluída a venda de nove marcas editoriais da Global Media – Jornal de Notícias, TSF, O Jogo, Jornal de Notícias História, NTV, Delas, Notícias Magazine, Volta ao Mundo e Evasões. A venda foi feita à Notícias Ilimitadas, controlada em 70% pela Verbos Imaculados e que por seu lado tem como acionistas três empresas – a Ilíria – Serviços de Consultoria e Gestão, com 35%, a Parsoc – Investimentos e Participações, com 30% e a Mesosystem, com 15% – e ainda, com 20%, o jornalista Domingos de Andrade, atual diretor-geral da TSF e diretor-geral editorial das outras marcas vendidas.

A Páginas Civilizadas tem 50,25% da Global e é agora detida a 100% pelo empresário Marco Galinha, proprietário do grupo BEL, que também esta terça-feira comprou os 51% que eram detidos pelo World Opportunity Fund. A ‘nova’ Global Media continua a deter as marcas Diário de Notícias (DN), Dinheiro Vivo, Motor 24, Men's Health e Açoriano Oriental, assim como 30% da Notícias Ilimitadas.

“Prioridade absoluta”

A venda destas participações acionistas esteve para acontecer no final do ano passado e era vista então como uma operação essencial para concretizar o ambicioso projeto que o fundo de investimento World Opportunity Fund dizia ter para o grupo de comunicação social. Mas o negócio acabou por abortar por questões políticas e esse facto foi apontado como um dos motivos pelos quais a Global Media caiu num impasse acionista e agravou a sua situação financeira.

A 18 de junho, o Sindicato dos Jornalistas reuniu com o ministro dos Assuntos Parlamentares que comunicou que uma das prioridades do Governo para o sector dos media passava pela compra das participações na agência Lusa detidas pela Global Media e pela Páginas Civilizadas.

Na altura mantinham-se os atrasos nos pagamentos aos prestadores de serviços, nomeadamente aos jornalistas a recibo verde, situação que se mantém. Segundo o sindicato, Pedro Duarte disse estar a olhar para o assunto com “muita preocupação” adiantando que a compra das ações da Lusa era “uma prioridade absoluta" e alertando também que o Estado "não pode pagar mais do que o preço justo." Um acordo de princípio foi alcançado entre as partes a meio de julho, mas foi necessário concluir a venda de parte dos títulos da Global Media à Notícias Ilimitadas e Marco Galinha comprar os 51% do World Opportunity Fund para que o negócio avançasse.

A 10 de janeiro, Pedro Adão e Silva, ainda na qualidade de ministro da Cultura, revelou que o Estado propôs pagar cerca de 2,5 milhões de euros (a que seria necessário ainda descontar a dívida da Global à Lusa), pelas participações da Global Media e das Páginas Civilizadas na agência de notícias. Na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, numa audição sobre a situação na Global Media, o ex-ministro explicou que tinha sido enviada uma carta a Marco Galinha com uma proposta de compra das ações da Lusa por 2,6 euros cada, o que resultou num valor global de 2,531 milhões de euros. Este valor refletia um desconto face ao investimento feito pela Global e pela Páginas Civilizadas naquelas participações, sinal de que os acionistas tinham urgência em concretizar o negócio para injetar dinheiro no grupo.

Os 23,36% detidos pela Global Media foram comprados há cerca de 20 anos por cerca de 1,42 milhões de euros. Já os 22,35% da Páginas Civilizadas foram comprados à Impresa, proprietária do Expresso e da SIC, por 1,25 milhões de euros, a 31 de dezembro de 2021. No total, as participações foram adquiridas por 2,67 milhões de euros.

A ideia do anterior Governo, explicou então Adão e Silva, era aumentar a indemnização compensatória da Lusa já em 2024 e, dessa forma, tornar o seu serviço gratuito para toda a comunicação social, uma das medidas definidas para apoiar o sector.

Mas a 30 de novembro o governo liderado por António Costa anunciou que o negócio falhou por “falta de consenso político alargado”, o que levou a que a operação se tenha revelado “inviável”, remetendo uma decisão para o governo seguinte. Referiu então que a estratégia para a Lusa obrigava a "partilhar a sequência de decisões que pudesse vir a tomar com os partidos políticos com assento parlamentar, e designadamente com o maior partido da oposição" e que foi informado da posição do PSD de que “qualquer decisão ‘deveria ser tomada pelo próximo Governo’” que saísse das eleições legislativas antecipadas de 10 de março, após a demissão do primeiro-ministro António Costa.

Na altura o PSD expressou dúvidas quanto ao negócio e a 20 de janeiro o atual ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, à data deputado do PSD, disse mesmo que havia “uma série de aspetos” que tinham de ser “esclarecidos e trabalhados”. “O que aconteceu neste processo foi uma total opacidade de querer comprar à pressa uma participação sem que uma série de aspetos estivessem claros”. O novo Governo PSD/CDS, que tomou posse a 2 de abril, manteve a intenção do anterior e confirmou que a venda daquelas participações e o fornecimento gratuito do serviço de notícias aos meios de comunicação social portugueses são mesmo para avançar.

As conversas tinham-se iniciado em agosto com a manifestação de interesse dos acionistas da Global e da Páginas Civilizadas em vender as participações sociais na Lusa. Outra das condições referidas pelo anterior governo para que a operação fosse avante passava por "salvaguardar tanto os interesses do Estado quanto os da Lusa", o que passava por "uma avaliação dos capitais próprios da empresa" por "uma entidade independente", a "liquidação da dívida que as empresas do grupo Global Media" têm à Lusa e "uma alteração do modelo de governação da agência, que garantisse a sua independência editorial a salvo de qualquer risco de interferência política".