George Soros vai passar o testemunho à próxima geração. No domingo, um porta-voz do milionário nonagenário anunciou que o filho Alexander Soros - de 37 anos, o segundo mais novo de cinco filhos - passará a liderar o conjunto de investimentos da família avaliados em 24 mil milhões de euros e a organização filantrópica Open Society Foundations (OSF), que financia vários projetos da sociedade civil pelo mundo.
E, em entrevista ao Wall Street Journal, Alexander Soros disse que vai continuar a promover ideias e iniciativas contra a nova direita, em particular a norte-americana: “por mais que eu gostasse de deixar de pôr dinheiro na política, enquanto o outro lado o fizer nós também vamos ter de o fazer", frisou.
Passar o testemunho a um dos herdeiros não era, porém, a intenção original do magnata, que se celebrizou por apostar na queda da libra esterlina em 1992. O short selling [vendas em posições curtas] da moeda do Reino Unido fez com que Soros lucrasse o equivalente a mil milhões de euros, forçando o Banco de Inglaterra a abandonar os intervalos de cotação definidos pelo Mecanismo Europeu de Taxas de Câmbio. O descalabro na moeda, e para as contas públicas britânicas, viria a ser conhecido como Quarta-Feira Negra.
Soros já tinha manifestado a sua intenção de nem sequer considerar a sua prole para a sucessão: “Não queria que a fundação fosse liderada por um dos meus filhos, numa questão de princípio. Pensei que deveria ser gerida pela pessoa mais adequada", disse, citado pelo jornal norte-americano. Agora diz que Alexander, filho da sua segunda mulher, Susan Weber, “merece-o”.
E, mesmo que Soros mudasse de ideias e transmitisse a liderança do legado à família, Alexander nem era tido como a primeira opção. Jonathan Soros, advogado de 52 anos, o terceiro filho do investidor, era encarado como o sucessor mais provável - até que o pai e potencial herdeiro se desentenderam. Descrito pelo Wall Street Journal como “alto e atlético”, parceiro de partidas de ténis do pai, e responsável pela “estabilização do hedge fund dos Soros durante tempos de turbulência”, acabaria por ser preterido em prol do descendente mais novo.
Diferenças de temperamento entre o progenitor e o filho na gestão - o primeiro é descrito como “impulsivo”, quando Jonathan é considerado mais “analítico e contemplativo” - e embates entre os dois fizeram com que o potencial herdeiro acabasse por deixar a gestão dos investimentos da família em 2011, depois de ter ingressado na estrutura em 2002.
Alexander, que não tinha uma ligação forte com Soros depois de anos entregue à mãe e a amas, reaproximar-se-ia do pai por alturas do divórcio deste da sua segunda mulher, em 2004.
Quem é Alexander Soros?
Alexander, eleito presidente não-executivo (chairman) da fundação em dezembro do ano passado numa espécie de pré-aclamação, partilha as orientações políticas do pai. A OSF financia projetos da sociedade civil e políticos - com tendências liberais associadas à esquerda - num total de cerca de 1,5 mil milhões de euros por ano, detalha o jornal.
Mas não era tido, nem de perto nem de longe, como o sucessor mais provável, por ser conhecido pelo estilo de vida mais frívolo, pelo leque de amizades que incluía supermodelos e jogadores de basquetebol, e pelas festas que dava, reportava em 2016 o Daily Mail.
“Numa altura em que se esforça para sair da sombra do pai”, escrevia o tablóide nesse ano, “Soros já percorreu um longo caminho em relação ao ”rapaz gordinho e muito tímido"" que era na infância.
O herdeiro era então descrito como alguém que, apesar de tudo, não perdia de vista a carreira académica (é doutorado em História pela Universidade de Berkeley) e o trabalho filantrópico; e que não ostentava através dos marcadores de classe habituais - carros, roupas caras - o dinheiro que tinha, avançava uma fonte ao jornal britânico.
A transformação deste rapaz tímido, focado em futebol americano (desporto de que o pai não gostava), e adepto de debates filosóficos (que serviram para aproximá-lo do progenitor), num potencial líder das organizações de Soros começou no final da década de 2000, quando começou a trabalhar intermitentemente na fundação. Passou despercebido: ia a reuniões, mas não falava, avançaram antigos trabalhadores ao Wall Street Journal.
A saída do irmão mais velho abriu espaço para que assumisse, em 2015, um cargo a tempo inteiro e assim, com a ajuda de quadros próximos do pai, foi “aperfeiçoando as suas capacidades oratórias e políticas”, diz o jornal. Acabaria por ser conhecido pelas extensas notas que tirava no seu bloco e pela tendência para a microgestão.
Tornar-se-ia o braço-direito de George Soros; aumentando ao mesmo tempo o perfil público da OSF ao multiplicar os investimentos em fundações com causas carismáticas, como a proteção da vida indígena nas Américas e o processo de paz na Colômbia, iniciado com a promessa de cessar-fogo, em 2016, pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC).
O dinheiro para iniciativas vai continuar a jorrar, estando reservados grande parte dos 23 mil milhões de euros do pecúlio da família para a OSF, segundo o jornal.
Tudo para desgosto particular da nova direita norte-americana e húngara (que forçou o encerramento da delegação da OSF em Budapeste em 2018, juntando-se a países como a Rússia na proibição das atividades da fundação), e de milionários como Elon Musk, principalmente depois de Soros se ter livrado, em maio, da sua posição de 14,7 milhões de ações na Tesla.
Inimigos useiros e vezeiros em insultos públicos ao magnata descreveram, com tons anti-semitas, Soros como sendo um vilão promotor da desagregação do tecido social.