Reduzir, de forma significativa, os encargos fiscais na construção de novas habitações é, na opinião dos profissionais ligados aos três segmentos do sector imobiliário - construção, promoção e mediação -, a medida mais importante que o novo Governo social-democrata deveria tomar, de forma resolver o problema da falta oferta de habitação.
Um “choque fiscal”, que permitisse reduzir a excessiva carga que onera a construção para habitação – que significa em média cerca de 40%, do custo final do imóvel – e que deve ser acompanhada de um conjunto de outras medidas importantes, que passam pela estabilidade legislativa, pelamelhoria do processo de licenciamento urbanístico e por incentivos ao arrendamento, sobretudo aos jovens.
Numa altura em que já tomou posse a nova Secretária de Estado da Habitação, a arquiteta Patrícia Machado Santos, que assumiu na última semana a pasta de um sector que foi despromovido de Ministério, no anterior Governo socialista, para a Secretaria de Estado, a eliminação do atual défice na oferta de habitação em Portugal, problema que é estrutural e que resulta dos níveis reduzidos de construção que caracterizam os últimos 15 anos, exige a criação de uma “task force, temporária e excecional”, que leve adiante “um choque fiscal”, afirma Hugo Santos Ferreira, presidente da Associação dos Promotores e Investidores Imobiliários (APPII) . E concretiza: É preciso “reduzir ou deduzir a taxa de IVA (Imposto sobre Valor Acrescentado) máxima de 23% na construção deste que é um bem essencial, o fim do AIMI (Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis) sobre terrenos ou prédios para habitação e o fim do IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) e IS (Imposto de Selo), como refere a OCDE”.
Taxa de IVA reduzido para reabilitação
Para Manuel Reis Campos, presidente da Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI), é “fundamental rever a carga fiscal incidente sobre a construção, reabilitação, transação e posse de casas em Portugal, que têm vindo a ser tributada como se a habitação fosse um bem de luxo, ignorando-se o efeito das taxas e dos impostos no seu preço final”. Neste âmbito, o responsável considera essencial “a aplicação da taxa de IVA reduzido às obras de reabilitação e construção de habitações, bem como a eliminação de impostos excessivos como o AIMI e o IMI incidente sobre o stock de imóveis detidos para venda”.
A mesma opinião é expressa por Paulo Caiado, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária (APEMIP), que alerta que o novo Governo deve implementar medidas que reduzam significativamente os encargos fiscais associados à edificação de novas habitações. Assim, é necessário “isentar ou reduzir com significado a estrutura fiscal associada à edificação de habitações novas permitiria dispor de uma margem de redução de preço final próxima de 40% do valor de um imóvel”.
Francisco Bacelar, vice-presidente da Associação dos Mediadores de Imobiliário (ASMIP), alerta sobretudo para a necessidade de promover os “incentivos fiscais ao arrendamento acessível”, reduzindo a “burocracia para preenchimento dos requisitos”. Acrescenta, “que tudo que seja dar confiança aos senhorios para incentivar o arrendamento, é de extrema importância para melhorar o acesso à habitação. Mexer nas normas fiscais, reduzindo tributação é fulcral”.
Também Nuno Garcia, diretor-geral da empresa de engenharia GesConsult, destaca que “a implementação de incentivos fiscais é crucial”. Alerta para a “redução do IMI para novas habitações, a concessão de benefícios fiscais a investidores que promovam habitação a preços acessíveis, ou a criação de um regime fiscal favorável à reabilitação urbana”. Relativamente, ao regime para a reabilitação urbana Nuno Garcia, alerta para a necessidade de existir “uma intervenção urgente do novo Governo, uma vez que o antigo Governo terminou de forma generalizada com este benefício fiscal”.
Incentivos aos jovens
A APPII sintetiza em sete medidas, as soluções que considera que é necessário que o governo tome de forma a alcançar mais habitação no nosso país. Nessas medidas destaca-se a necessidade de alargar a “taxa de IVA reduzido a todos os projetos de construção nova para arrendamento habitacional e as isenções fiscais na aquisição de terrenos para projetos desta natureza”. Assim, alerta que devem ser criadas “linhas bonificadas para a compra de casa por pessoas até aos 40 anos”. E, simultaneamente, “a isenção de IMT e imposto de selo, em especial quando de se trate de primeira aquisição de imóvel, ou para habitação própria e permanente”.
Já Reis Campos, considera essencial, a “cedência de terrenos e imóveis devolutos do Estado a privados para aí serem desenvolvidos projetos habitacionais, a preços adequados ao rendimento dos portugueses, em particular dos mais jovens”.
Promover “uma vertente paralela de investimento para arrendamento, onde os investidores poderão ter a contrapartida de significativa redução da estrutura fiscal, com a condição de arrendamento a preços predeterminados” é, na opinião de Paulo Caiado, uma das medidas que não pode ser descurada pelo novo Governo.
Bem como a criação de um segmento de mercado “com preços controlados, utilizando a estrutura fiscal existente, é fundamental para tornar a habitação acessível e, simultaneamente, promover um ambiente favorável para compradores e investidores começarem a acreditar num mercado de arrendamento a preços acessíveis”, alerta ainda o responsável da APEMIP.
Francisco Bacelar destaca a “disponibilização de imóveis do Estado para construção, reconversão ou reabilitação para arrendamento acessível”, bem como a necessidade de incentivar a construção através das cooperativas de habitação.
Aumentar a velocidade de aprovação dos projetos
Depois do Simplex urbanístico falta concluir o Código da Construção e implementar uma cultura de eficiência e digitalização processual nos municípios em prol da habitação, uma via verde para mais habitação, considera Hugo Santos Pereira.
Na sua opinião, “é urgente aumentar a velocidade de aprovação dos projetos residenciais”. E, por fim, “lutar pela criação, até 2026, da plataforma única de submissão de processos (em 2024 não é admissível perderem-se nas nossas câmaras municipais projetos em papel)”, alerta.
Também Nuno Garcia destaca a simplificação dos processos de licenciamento, visando a redução dos prazos e custos envolvidos, além da eliminação de burocracias desnecessárias. “Neste caso existe já um ponto de partida que é o Simplex, cujas portarias entraram em vigor a 4 de março deste ano, mas que merece um acompanhamento e aperfeiçoamento característica de qualquer alteração de fundo que é introduzida”, refere.
Reis Campos refere, por outro lado, que no que concerne ao Simplex urbanístico, uma reforma há muito exigida pelas empresas, “é urgente resolver os desafios da sua aplicação, o que exige um esforço de adaptação das câmaras municipais às novas regras e que seja complementado com um Código da Construção, que atualize, simplifique e agregue os requisitos técnicos e urbanísticos que se encontram dispersos por inúmeros diplomas”.
Destaca ainda, a necessidade de reverter “o fim dos Vistos Gold e as restrições impostas ao Alojamento Local, uma vez que contribuíram muito positivamente para o desenvolvimento das cidades portuguesas”.
Por fim, o responsável da APPII destaca a necessidade de trazer mais confiança e estabilidade ao sector da construção da habitação. Que só se conseguirá “através da criação de um pacto de regime com incentivos para quem se comprometer a construir habitação com a garantia que as medidas vão vigorar por 10 anos, 20 ou 30 anos”.