ARQUIVO José Mourinho

«Não me lembro de alguém me ter pedido desculpa»

O treinador do Chelsea confessa que gosta pouco de pedir desculpa aos seus rivais. Eis algumas perguntas que ficaram de fora da entrevista concedida por José Mourinho ao EXPRESSO, para ler sábado na  Única.

Não o assusta não ir à frente desta vez?

É uma experiência nova para mim. Nas outras duas épocas começámos à frente muito cedo. Já nas duas épocas anteriores, em Portugal, foi a mesma coisa. Eu sempre disse – e não mudo o discurso agora que sou o perseguidor – que é melhor ir à frente. Quem vai à frente só tem de pensar nele próprio. Quem vem atrás tem de ter alguma preocupação para que aquele que vá à frente tenha os seus percalços.

Há dois anos disse em entrevista ao Expresso que se considerava a grande cabeça do futebol não só em Portugal como na Europa. Continua a achar-se o melhor dos treinadores?

Isso são troféus. Ganhei os dois últimos anos mas estou convencido que este ano não voltarei a ganhar. Não é porque seja melhor ou pior do que era, mas o futebol é mesmo assim. Nos últimos anos não ganhei competições europeias. O troféu vai e vem. É como com os jogadores e a Bola de Ouro. Umas vezes vai para o Zidane, outras vezes vai para o Figo. Agora, é óbvio que estou num grupo de elite onde há seis, sete ou oito treinadores. Treinamos os melhores clubes, estamos nas melhores competições, conseguimos os melhores resultados, ano após ano.

A imprensa inglesa diz que o Chelsea joga menos bonito do que outras equipas.

O poder económico das equipas consideradas não candidatas ao título é tremendo. Não está a ver uma equipa como o Braga ou o Vitória de Setúbal pagar dez ou 15 milhões de euros para contratar um jogador. Aqui, uma equipa do fundo da tabela gasta tranquilamente seis, sete milhões de libras por um futebolista. Cada jogo pode-se perder ou ganhar. A exigência é tremenda. Depois, há muitas competições. Chegamos ao final de uma época com 60 a 65 jogos.

Lembra-se de alguma vez ter pedido desculpa a um treinador adversário? Alguns sentem-se ofendidos consigo.

Também não me lembro de alguém me ter pedido desculpa. Às vezes nem há necessidade da palavra. Por exemplo, eu e o Benitez, do Liverpool, tivemos um ou dois jogos em que trocámos declarações um pouco mais agressivas e onde o jogo terminava e nem sequer nos cumprimentávamos. Esta época eu estava à espera dele no túnel e, sem, uma única palavra abraçámo-nos. Para mim, isso tem mais significado do que algum de nós ter dito que esteve mal ou esteve bem. Estivemos os dois mal. Já nos encontrámos depois disso meia dúzia de vezes. Mais vale um gesto do que uma palavra. Quando as pessoas gostam uma da outra, como é o caso, as coisas acabam sempre por se resolver.

Tem consciência de que muitas vezes saem artigos sobre si que nada têm a ver com futebol?

Tenho a noção disso.

O nome Mourinho traduz uma atitude e é usado para muitas coisas. Até para a gestão. Tem ideia de que a imprensa inglesa o trata de forma diferente do que a imprensa portuguesa quando estava em Portugal?

A imprensa portuguesa é muito mais futeboleira. Eu dava uma conferência de imprensa antes de um jogo qualquer e no dia seguinte O Jogo, o Record, A Bola faziam uma transcrição palavra por palavra. Eram capazes de fazer uma página sobre a minha conferência de imprensa. Em Inglaterra a imprensa não há um único jornal desportivo. Há duas ou três páginas de desporto em cada jornal, desde o Sun ao Times. Eu nem consigo saber pela imprensa qual é o jogador que está lesionado na equipa com que eu vou jogar.

Tem a sua equipa de sonho?

A equipa de sonho não existe. Há jogadores que jogam noutras equipas e que são intocáveis. Os grandes clubes não vendem os seus melhores jogadores. Mas tenho um plantel muito bom, com pequeninas lacunas, como todos têm. O grande segredo é fazer com que o todo seja melhor do que a soma das partes. Aí é quando a equipa está concluída.

Está contente com Hilário?

É uma situação muito específica: ser suplente do melhor guarda-redes do mundo. Se tudo corre bem e não há lesões, os guarda-redes suplentes são capazes de passar uma época inteira sem jogar. O que aconteceu com o nosso abriu as portas ao Hilário e eu não podia estar mais contente. Ele tem contrato por mais um ano e meio e penso que a tendência natural das coisas é renová-lo por mais tempo ainda.

Tem acompanhado o processo do Apito Dourado em Portugal?

Não consigo acompanhar um processo que dura 100 anos.

Há um fundo de verdade no Apito Dourado?

Eu acho que a história dos árbitros é uma história interminável e só a tecnologia poderá melhorar as coisas. Não entendo como numa indústria tão forte como é o futebol, a tecnologia na arbitragem não existe. Ela reduz os erros e ao reduzir os erros, reduz a crítica e a suspeição. E reduz a responsabilidade dos árbitros. Uma coisa é um fiscal de linha decidir um jogo por um fora de jogo mal assinalado, outra coisa é a tecnologia substituir o fiscal de linha numa decisão crucial. A tecnologia no futebol é o fim de todos os Apitos Dourados que possam existir.

Leia no próximo sábado a entrevista completa, na Única