A história artística da dupla Jonas & Lander começa assim: uma performance, em dueto, dos dois intérpretes e criadores, Jonas Lopes e Lander Patrick, de olhos vendados, à chapada um ao outro. É um belo início de um percurso artístico muito diverso, que em 2021 teve mais um momento marcante, a estreia de “Bate Fado”. Ali, a dança contemporânea encontra as raízes de uma dança antiga esquecida, conhecida como “fado batido”. O espetáculo de dança é também um concerto de fado, trazendo para o universo da dupla a identidade artística de Jonas Lopes, que é bailarino e fadista. Mas claro que essa primeira peça, que chamaram “Cascas d’OvO”, e que faz parte do programa do CCB que celebra 10 anos de carreira de Jonas & Lander, é mais do que o que se pode depreender pela descrição redutora e caricaturada de dois bailarinos à chapada.
O universo artístico de Jonas & Lander é constante metamorfose. Cada nova criação é um novo mundo que os dois inventam. Há alguns traços de identidade que as vão atravessando: um colorido excêntrico, o humor, o rigor extremo no detalhe de cada elemento que integra o espetáculo. A estreia de cada peça é a revelação de um imaginário inesperado. A inventividade do léxico coreográfico é tão espantosa quanto os recursos cénicos e musicais ou teatrais. “Cascas d’OvO”, peça inaugural estreada em 2013, é exemplar de tudo isto. A composição da linha teatral e de movimento coloca os dois, um frente ao outro, de olhos tapados, percorrendo uma partitura que passa por ritmos variados de estalos nas caras. Parece uma brincadeira de crianças com momentos hilariantes, mas contém um desdobramento inusitado do que pode significar uma mão numa cara, passando da ternura à violência, do gesto lento à brusquidão, e da tensão ao riso hilariante, e tantas outras camadas vão surgindo, que tornam efetivamente esse enunciado simples num espetáculo cheio de significados. Além de que contém outras componentes, outras ações, adereços e gestos inusitados, que importa não revelar antecipadamente.
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