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“Não sei fazer outra coisa a não ser pensar”: Eduardo Lourenço na sua última entrevista. Morreu há um ano

Faltava um mês para Eduardo Lourenço fazer 94 anos. Ao mesmo tempo lançava “Da Pintura”, textos inéditos cujo título está longe de dizer tudo. Foi o pretexto para uma conversa em 2017 que, como ele diria, percorreu vários lugares ou nenhum, e que agora recuperamos, quando se cumpre um ano da sua morte

Tiago Miranda

Fala como escreve. Com a sintaxe viva de imagens e derivações. Não há frase que não tenha peso, textura, cor, densidade. Ou humor puro e leve. Recebeu-nos no seu gabinete da Fundação Calouste Gulbenkian para meia hora de conversa, que triplicou apesar do cansaço, porque o professor gosta de contar, gosta de pensar. E de pensar no que pensa. Desta vez havia um livro em cima da mesa. “Da Pintura” (ed. Gradiva), organizado e prefaciado por Barbara Aniello, cujo conteúdo são anotações soltas, fragmentos, textos curtos — a maioria não datados, embora situados entre 1946 e 2013. Todos inéditos. Observações sobre arte, pintura, beleza e estética que estavam no fundo do baú e com as quais, por vezes, do alto dos seus 94 anos, nem sempre concorda. Está a folheá-lo — o cheiro de um livro novo — quando entramos. E esse gesto determina o rumo da conversa.

Recebeu-os hoje?
Fui surpreendido pelos livros esta manhã. Este é composto por notas, papéis, agendas que eu tenho. Como esta [tira do bolso um pequeno caderno]. Não consigo desfazer- -me dela nem passar o que está aqui escrito para uma outra, onde possa começar de novo.