Ao lado da página pessoal que tenho no Facebook, e que apenas utilizo para sinalizar as crónicas e editoriais que escrevo semanalmente, decidi criar, nessa mesma rede social, uma "página empresa" com o objectivo de difundir uma das actividades em que estou profissionalmente envolvido.
Os fãs apareceram com uma velocidade estonteante e, se essa cativação equivalesse a negócio, estaria já rico a beber gim tónico de charuto na mão a bordo de um resort qualquer da Polinésia. Mas percebi bem cedo que os fãs entram tal como a luz matinal entra no meu quarto, ou seja, de modo natural e sem interpelações. Dir-se-á, por outro lado: sem sentido nenhum, tendo em conta a actividade que ali deveria reunir apenas os interessados.
Uma das pessoas que por ali passou - e que logo ficou fã -, confrontada com esta inadequação óbvia, deixou escrito no mural uma passagem a todos os títulos esclarecedora. Ora leia-se: "...num site como este é fácil clicar num botão e, sem sabermos como nem porquê, tornamo-nos fãs até das reticências (só digo isto porque nada mais me ocorre)...".
Melhor do que esta prestação, é difícil. E a senhora apenas escreveu o que escreveu - óptima metáfora, realmente, a das "reticências" - por ter sido, no momento, a expressão mais apropriada para traduzir o que lhe iria na alma. Nada mais "lhe ocorreu"!
O que comanda as escolhas no Facebook não é, portanto, uma súmula de interesses ou critérios e muito menos a liberdade individual de poder seleccionar caminhos. Não, absolutamente nada disso. Existe um fluxo bem anterior a tudo isso, espécie de voragem cega que manipula vontades, desejos e opções tal como se manipulam marionetas.
Mas uma manipulação sem patrono orwelliano. Por outras palavras: uma manipulação de tipo novo que começa e acaba em quem a pratica. Uma automacidade que ilude a liberdade.
Apetece dizer: o vazio apenas existe para que as reticências o preencham. Como suas boas fãs. Porque nada mais lhe ocorre. Ao vazio.
Sinal dos tempos, diria eu.