1.Finalmente, o Governo anunciou o que já todos sabíamos: Portugal terminará o programa de assistência financeira daqui acerca de duas semanas, regressando sozinho aos mercados financeiros - é nisto, basicamente, que consiste a tão badalada "saída limpa. Em rigor, a comunicação de Passos Coelho, ontem, aos portugueses não consistiu numa revelação original, muito menos na divulgação de uma surpresa: tratou-se apenas da confirmação de um futuro que já estava traçado há muito. Ocorreu, pois, uma convergência objectiva de interesses de um Governo que tinha de conseguir o regresso, sem muletas aparentes, do país aos mercados - e de uma conjuntura (que, infelizmente, já se começa a converter em estrutura) política europeia marcada pela incapacidade institucional de resposta política e de definição de soluções baseadas na solidariedade: a Senhora Merkel falou, a Senhora Merkel impôs. Evidentemente que a solução da "saída limpa", mais do que esperada ou até desejada pelo Governo Passos Coelho, foi imposta pelo eixo que domina actualmente a União Europeia (Alemanha-Holanda-Finlândia): Passos Coelho foi, pois, empurrado para a saída limpa, não tendo, no imediato, outra solução alternativa. E porquê esta vontade incontrolável de Angela Merkel de empurrar Portugal para a "saída limpa"? Primeiro, porque pretende anunciar aos alemães que o seu dinheiro (para os alemães, todo o dinheiro europeu é dinheiro alemão) não foi em vão: o programa de ajuda financeira obteve mais um êxito, saldando-se na "salvação" de mais um Estado à beira da falência. Em segundo lugar, o modelo de programa cautelar ainda não foi testado, pelo que estar a definir pela primeira vez um, em exclusivo para Portugal, poderia comportar riscos. Em terceiro lugar, Angela Merkel está, naturalmente, interessada que Passos Coelho tenha um bom resultado nas eleições europeias: afinal de contas, quer eleger o Presidente da Comissão Europeia por si escolhida:Jean-Claude Juncker. Neste sentido, dizer-se que Portugal terminou com sucesso o programa, que pode regressar, por si próprio aos mercados, é, à primeira vista, eleitoralmente mais impactante do que dizer que Portugal termina o programa, mas ainda vai precisar de programa adicional.
O que mudará na vida dos portugueses com esta "saída limpa"? Rigorosamente nada. Porquê? Porque a verdade é que até agora tínhamos a troika aí bem presente - a partir de Junho, teremos a "troika" escondida à espera de aparecer novamente. Sempre a observar cada passo do Governo, cada medida tomada, a avaliar se as ditas reformas estruturais avançam ou não. É que, em rigor, as metas orçamentais definidas pela troika ainda não foram cumpridas - e, na derradeira avaliação que fecha o programa de assistência, a troika exigiu as medidas do tão famoso Documento de Estratégia Orçamental , aumentando novamente os impostos e a TSU. E ainda há um montante significativo de dinheiro que precisa de ser obtido ou reduzido, cortando na despesa do Estado, e que no documento surge como "indefinido": isto é, o Governo ainda não sabe como irá fazer, mas terá de comunicar à troika as medidas que irá aprovar. É precidsamente aqui que deverá entrar a reforma do Estado tão prometida por Paulo Portas. Mais do que mérito de Passos Coelho (note-se que o regresso aos mercados, esta saída limpa, é o mínimo dos mínimos, após todos os sacrifícios que o Governo exigiu aos portugueses: é como um aluno ter 10 no exame final), a "saída limpa" é obra do DEO e da conveniência da "troika" e, sobretudo, de Angela Merkel.
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