1. Na terça-feira passada, os portugueses vibraram com os golos de Cristiano Ronaldo que ditaram o apuramento de Portugal para o campeonato do Mundo do próximo ano no Brasil. O tema dominou hoje a imprensa nacional, desde a capa dos jornais desportivos até às capas dos jornais (ditos) de referência. Os intelectuais de sempre qualificaram este entusiasmo nacional como sendo "pacóvio", "patético", "patriotismo saloio" ou "digno de um país de terceiro mundo". Pois bem, eis um exemplo de uma situação em que os intelectuais não têm razão nenhuma. Ora, os países que mais vibram com o futebol, na Europa, até são os ingleses e os alemães - em relação aos quais ninguém se atreve a dizer que são pacóvios ou patéticos. Estes nossos "intelectuais" até consideram a Inglaterra e a Alemanha como os países da "cultura superior", verdadeiros exemplos de civilização e progresso. Mais: os mesmos intelectuais que criticam a relevância dada ao futebol em Portugal formam a elite dirigente bem pensante que passa a vida a elogiar Angela Merkel (isso sim, verdadeiro exemplo de pacóvia nacional) - a mesma Chancelerina que esteve presente em praticamente todos os jogos da Alemanha no Europeu de 2012, vibrando com as vitórias e exasperando-se com as derrotas da sua selecção nacional. E recorde-se que o G20 realizado no Verão de 2012 parou para ver o jogo das meias-finais do Europeu, incluindo o Presidente Barack Obama! Será o Presidente dos EUA pacóvio ou pateta, porque gosta de ver um bom jogo de futebol? Claro que não! Nem Portugal deixa de ser um país civilizado e desenvolvido pelo facto de a maioria dos portugueses gostar de estar ao lado da nossa selecção nacional! Portanto, como o futebol é um factor de agregação do povo português e um motivo para o Mundo inteiro falar de Portugal, ouvir o nosso hino e a contemplar a nossa linda bandeira, todos vibrámos com os golos da equipa Portuguesa. Sempre que estiver em causa o nome e a bandeira de Portugal, devemos apoiar incondicionalmente os nossos representantes em qualquer área, da ciência à cultura, passando pelo desporto e , em particular, o futebol.
2.Dito isto, reconhecemos que há um excesso de protagonismo do futebol na nossa vida colectiva - os portugueses tendem a transmitir para os jogadores da equipa nacional desta modalidade aspirações e ambições que não exigem na sua vida corrente aos políticos, aos seus colegas de trabalho, aos seus trabalhadores, aos seus patrões, aos seus dirigentes sindicais e por aí fora. O problema não é, concluímos, a atenção dedicada ao futebol - é a transformação do futebol como o meio de expiação dos nossos falhanços e frustrações enquanto comunidade política. Em vez de criticar o fenómeno social que é o futebol, devemos aprender as suas lições positivas (note-se que quando digo fenómeno social, refiro-me ao sentido amplo do termo social, incluindo o lado político: pense-se, por exemplo, que François Hollande suspirou de alívio quando soube que a França conseguiu ir ao Brasil- o terceiro golo da França era uma imprevisibilidade muito previsível...):
a) Os portugueses quando querem, se concentram na prossecução de um determinado objectivo e trabalham em conjunto brilham sempre, no futebol e na vida;
b) Os portugueses trabalham muito bem sob pressão e tendem a desleixar-se em cenários de normalidade - o que leva a que sofram dissabores evitáveis por mais tempo do que seria desejável;
c) Os portugueses só trabalham eficazmente e com sucesso mediante uma liderança que eles consideram legítima, idónea e galvanizadora. Os portugueses gostam de autoridade, embora não de autoritarismo. Por isso, é que Paulo Bento recuperou a selecção depois do "piloto automático"...
3. Pois bem, politicamente, o problema português é que andamos em "piloto automático"há muito tempo e, sobretudo, desde que Paulo Portas revogou o seu irrevogável. Li num blogue que qualquer dia a troika irá penhorar o Cristiano Ronaldo para pagarmos a nossa dívida. Pois...O problema é que a troika, através de Passos Coelho que obedece cegamente aos seus ditames, já está a penhorar o futuro de uma geração inteira: uma geração mais qualificado, fruto de um imenso investimento do Estado ao longo de décadas, mais inovadora, com mais sentido e espírito de risco...Precisamos de uma mudança rápida de rumo, sob pena de Portugal passar a ser um país pobre e irrelevante. Enfim, eu sou optimista e sei que em Portugal há muitos "Cristianos Ronaldos" em muitas áreas que saberão marcar golo na altura certa...
Email: politicoesfera@gmail.com