É público e notório que nunca nutri grande esperança no sucesso do Governo Passos Coelho. Desde logo, pela falta de estratégia, que mesmo na pré-candidatura de Passos às directas do PSD era por demais evidente, pela falta de competência política dos que rodeavam Passos, pela falta de liderança congénita do nosso Primeiro-Ministro. Portanto, o insucesso e os problemas que o Governo diariamente revela não são para nós uma novidade: antes, constituem - apenas e só! - a revelação de uma verdade há muito anunciada. Contudo, devo admitir que há gente neste Governo que, infelizmente, me está a desiludir profundamente. Gente em que eu depositei confiança (mais ou menos ténue) para lutar por um mínimo de decência e lucidez no seio de um Governo cuja composição inicial era verdadeiramente aterradora: destaco, neste particular de "capital de confiança", o Ministro da Educação e Ensino Superior, Nuno Crato.
Já tivemos, por diversas ocasiões, aqui no POLITICOESFERA, a oportunidade de elogiar as qualidades académicas, o currículo e o percurso pedagógico que Nuno Crato exerceu na comunicação social - aqui no EXPRESSO -, explicando aos portugueses as lógicas, os "aparelhismos", a infindável burocracia que impedia a reforma do sistema de ensino e a modernização do ensino em Portugal. Além disso, Nuno Crato escreveu diversos livros -muitos dos quais, verdadeiros best-sellers - em que propunha uma visão arrojada, sem complexos, da educação no nosso país, enaltecendo a posição dos professores portugueses, que classificava como uma das melhores categorias profissionais de Portugal. E, sendo um Professor Universitário, sempre julguei que Crato percebia as inquietações, as dificuldades que os sucessivos Governos (PS e PSD/CDS) têm colocado à afirmaão plena das Universidades Portuguesas, estrangulando-as do ponto de vista financeira e obstando à produyção científica dos seus docentes. Achava eu, com base nos escritos de Nuno Crato, que finalmente iríamos ter um Ministro capaz de entender cabalmente a função que as Universidades exercem no controlo do poder político, na sua racionalização e legitimação, sendo permanentemente uma voz activa, independente e distante - mas, sempre, sempre, socialmente empenhada. Achava eu, com base nos escritos de Crato, que era agora a oportunidade de ter um Ministro que não tolerasser quaisquer tentativas de "politização" das Universidades. Enganei-me. Nuno Crato tem-se revelado, ultimamente, um Ministro do Ensino Superior inexistente, que se recusa a participar na resolução dos problemas das instituições universitárias (tendo de chamar para show off Passos Coelho para comparecer nas reuniões com os Reitores); e um Ministro da Educação absolutamente titubeante, sem convicções, apenas divagações pontuais.
Veja-se o que aconteceu no caso dos exames de acesso à carreira de docente. Primeiramente, era um exame universal, abrangendo todos os docentes - o Governo defendeu, de tal forma este modelo, ao ponto de alguém afirmar que estava de fora de hipótese recuar. Depois, fonte do Governo passou a ideia de que, afinal, o modelo teria de ser afinado. Tudo para no final o Ministro Nuno Crato deixar cair a única medida em que verdadeiramente se empenhou politicamente! O exame abrangerá apenas os docentes que ainda não tenham completado cinco anos de docência....
Este caso do exame é um retrato perfeito do estado do Governo Passos Coelho: faz tudo ao contrário do que mandam as regras e o mínimo de lucidez política. Se o objectivo era negociar a medida com os sindicatos, com os representantes dos professores, por que diabo não se começou primeiro a ouvir, primeiro a reflectir sobre as críticas à medida legislativa - e só depois desta "concertação" é que se avançava com o conteúdo definitivo (ou tendencialmente definitivo) da medida, evitando o Governo as críticas veementes de especialistas, a contestação de rua dos professores e a luta dos sindicatos?
Tudo somado, o Governo perdeu porque durante semanas a sua imagem foi desgastada pela contestação dos professores. O Governo perdeu porque teve de ceder, abdicando da sua política. O Governo perdeu porque dá, mais uma vez, uma imagem de amadorismo e incompetência politica. A partir de agora, Nuno Crato fica refém dos sindicatos, sem espaço de actuação própria. Minha interrogação: este Governo ainda existe? É que o Ministro dos Negócios Estrangeiros (que sabe mais a dormir do que todos os outros acordados) já desaparecu do mapa (calado por Passos Coelho); o Ministro Adjunto praticamente não existe politicamente; a Ministra da Justiça anda desaparecida...resta Passos Coelho e Maria Luísa Albuquerque. Isto claro, para não falar de Paulo Portas e António Pires de Lima que correm em pista própria....
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