O modo do tempo

Tucídides

António de Castro Caeiro

A crise é o que é. Não compro os livros que comprava. A Internet fornece o que leio. Aprendi a ser pirata também.

Desde sempre habituei-me a mandar livros: Gramáticas e Clássicos de todo o lado do mundo. Todos: Latinos e Gregos. Loeb, Oxford Classical Texts. Chegam-me livros da Common Wealth: Nova Zelândia, Austrália, Johannesburg, Oxford, Cambridge, Munique e Berlim.

Tucídides escreve a dividir os anos em Primaveras e Verões.

Compro todos os comentários. A gramática não chega.

Chegou-me o primeiro volume da Loeb. Quero ir para a praia sem dicionário. É para aprender Inglês. Sou snob. Estudo Grego desde os 16 anos.

Chegou um livro em casa da mãe. Nunca estou na minha.

Abri o pacote. O cheiro era diferente de todos os outros.

Li a introdução. Vi os mapas.

Tucídides morreu assassinado.

"O cheiro do livro", diz a mãe.

O cheiro.

1919

Não tem importância o tempo. Estamos a falar do maior prosador da antiguidade. Claro que prefiro Tacitus. Mas o cheiro. O cheiro.

A Guerra do Peloponeso.

Quantas almas?

E se o meu coração for para Esparta.

Eu sou Dórico.

O Sétimo livro das Historiae Thucudydes ensinam.

O cheiro. O cheiro.

Ensinam-me, MESTRE, tudo.

O teu Grego.

O teu exílio.

A tua morte.

Quantas Primaveras trouxeram a morte?

Quantos Invernos trouxeram a morte?

O Inimigo não são os atenienses nem os espartanos.

São os persas.

O meu livro recebido hoje tem 94 anos.

Quantas gerações o leram?

Eu morro só com o cheiro!