Esta semana, o jornalismo mundial recebeu uma boa notícia. Motivo de orgulho e alguma inveja. Confesso que, nestas alturas, a distância entre a realidade e o desejo parece muito maior do que seria aconselhável para a manutenção da motivação.
Paul Steiger, ex-editor do "Wall Street Journal" também andava cansado, mas como os homens de fé e iniciativa, não baixou os braços. Pelo contrário, arregaçou as mangas e foi à luta. Frustrado com a falta de jornalismo de investigação a sério, conseguiu o apoio de um fundo privado de 10 milhões de dólares e aliciou um naipe de 24 jornalistas com currículo comprovado. Sabem para quê? Para criar uma experiência inédita e até agora utópica: um projecto de luxo, inteiramente dedicado ao jornalismo de investigação de qualidade.
O "ProPublica" arranca em Janeiro e a promessa é irresistível: fazer jornalismo de denúncia dos abusos de poder, sobretudo na área da política e dos mercados financeiros, mas também no meio académico, hospitais, fundações e os próprios media. Senhores, tremei. O jornalismo americano tem dos melhores exemplos da nossa história sobre como se segue um assunto socialmente relevante. Tem os meios técnicos e Steiger assegurou o essencial dinheiro. Só o dinheiro dá a liberdade necessária para levar avante um projecto de tal fôlego.
A notícia do "Público" revela que Steiger já terá recebido mais de 400 candidaturas (eu gostava tanto de mandar...), o que só é de estranhar pelo número reduzido, afinal a proposta é irresistível: podem gastar o tempo e o dinheiro necessário para cumprir a missão. Trabalho feito, este será oferecido GRATUITAMENTE ao jornal que melhor destaque puder dar ao artigo!
Exploração dos fracos pelos fortes, falhas das pessoas em quem depositámos confiança são os alvos principais. Jornalistas apartidários, apaixonados pelo mito da imparcialidade e pela crença no cumprimento dos critérios jornalísticos são o exército alerta. Em resumo, em causa está um projecto jornalístico sem fins lucrativos, financiado maioritariamente pela Fundação Sandler, uma das maiores organizações de filantropia norte-americanas, mas também com relevantes apoios da Fundação Knight ou do Fundo Pew.
O responsável, Paul Steiger, recebeu há cerca de uma semana o prémio de carreira do Clube Nacional de Imprensa norte-americano. Que prémios se seguirão para um defensor do puro jornalismo de interesse público? Eu, para já, dou o meu sincero aplauso. Que o exemplo frutifique em tempos de fraca memória e pouca coragem.
Christiana Martins, jornalista