Folheando os jornais, apanha-se muita coisa, perdem outras tantas. Muitas vezes, olha-se e não se vê. Há que estar atenta aos sinais. Vamos a um exercício.
O "El País" de domingo (2 de Dezembro) analisava a última fase do Governo Bush e alertava para a chegada do realismo. Trazido por Condoleezza Rice, este pragmatismo apoia-se nos resultados obtidos em Annapolis para demonstrar que o messianismo vai ficando para trás. Já não era sem tempo.
A mesma edição do "El País" trazia uma entrevista com Jeremy Rifkin, a quem eu entrevistara durante o verão, a avisar que o caminho para as alterações climáticas é imparável, mesmo que se cumpram os compromissos com as reduções de emissões de CO2. Assessor de Sócrates e de Zapatero, anda a espalhar a sua mensagem pela Europa, apelando à realização de uma Terceira Revolução Industrial. Mais uma vez, a resposta passa pela motivação, adesão e convicção de uma sociedade civil informada e actuante.
O último sinal que vem do jornal espanhol no último domingo surge nas páginas da revista. Um sinal sentido em Espanha de um novo jornalismo em Portugal. As fotografias de João Pina (fotógrafo português "free-lancer") respiram o que há muito se faz e fez no fotojornalismo norte-americano, mas que poucos resultados do mesmo tipo produziu internamente. Foi-lhe concedido entrar pelos bastidores de José Sócrates, revelando em Espanha mais do que se costuma ver nas páginas nacionais. Que seja um sinal. Depende dos profissionais que actuam em Portugal.
Acordei hoje, segunda-feira (3 de Dezembro) e fiquei logo mal disposta com o equívoco do "Público". Foi dizer na manchete que Hugo Chávez tinha vencido o referendo. O fecho não perdoa mas a ousadia deve ter sempre os limites do bom senso. O respeitado "El País" foi na mesma onda e, logo na página 2, titula: "Los primeros sondeos auguram la victoria de Chávez en el referéndum". Errado sim, mas também mais prudente. Na primeira página, a nota é igualmente equívoca, mas muito mais discreta, mesmo que para uma amplitude de leitores bastante mais interessados nos resultados venezuelanos do que a generalidade dos portugueses. Só para que os sinais não se percam: na página 59 da última "Economist", um artigo apontava para o resultado alcançado na realidade: "Are they beginning to loose the faith?", em que previa, e bem, que o "democratator", como o chama a "Time", começa a perder terreno.
Já na página 38, o "El País" publica uma análise mais ousada e optimista. Esperemos que seja uma previsão acertada. Avalia a situação de África e afirma que "la ayuda fracasa, pêro África despega", explicando que, depois da voragem da corrupção a devorar milhares de milhões das ajudas de cooperação internacional, os investimentos chineses e um novo tipo de ajuda começam a produzir resultados. Esperemos que sim.
O também espanhol "Expansión" alerta para uma mudança com impacto aparentemente menos sócio-político e mais económico: o gigante das telecomunicações Telefónica lançou-se à concorrência com os canais televisivos em nome da conquista do mercado publicitário. O jornal económico avisa que a operadora quer aproveitar a sua forte posição no negócio de acesso à Internet e dos telemóveis para captar anunciantes "online", um segmento em franco crescimento e que também interessa às grandes cadeias de televisão.
Acabo a revista de imprensa com duas notícias do "Financial Times". A primeira retoma a primeira nota deste post, pelo outro lado. Ou seja, afirma que "it's all about the economy for Clinton" e explica que os receios financeiros da classe média norte-americana poderão ajudar a consolidar a posição de Hillary na liderança da corrida pela Casa Branca. A economia é a principal preocupação da sociedade norte-americana, afirma o "FT", à frente mesmo da guerra do Iraque ou das ameaças terroristas. Mais uma prova de que voltámos à era do pragmatismo.
Um sinal preocupante, contudo, foi a carta, publicada no mesmo jornal, assinada pelo polémico assessor de George W. Bush e endereçada a Barack Obama. O conselheiro do actual presidente alerta ao senador que corre contra Hillary que, para vencê-la, terá, literalmente, de descalçar as luvas e desferir fortes golpes. Será sinal de que o nível da campanha vai descer? Uma oportunidade para Obama demonstrar qual a sua estratégia. E o seu carácter.
Antes que me esqueça. Um sinal para a Portugal Telecom. Na página 19 do "FT", uma notícia afirma que a France Telecom aponta o seu foco de crescimento para África. A mesma África que Henrique Granadeiro quer conquistar para a operadora portuguesa. A medição de forças entre portugueses e franceses em território africano não nos dá bons augúrios. Iremos a tempo? Há que estar atentos aos sinais.
Christiana, jornalista