Ré em causa própria

"Os juízes são iguais aos outros?" (IV)

Adelina Barradas de Oliveira, Juíza Desembargadora

Esta é uma máxima do código Bushido dos Samurai.

O Juiz é eticamente superior e intocável no sentido de que é incapaz de transgredir?!

Se me perguntarem qual o crime que nunca cometeria responderei rapidamente: - Não sei.

Se pensar melhor responderei :- corrupção, pedofilia ou tráfico.

Se me perguntarem qual o crime que me vejo capaz de cometer, responderei sem hesitar que, o mais vil de todos ou seja, aquele que atenta contra o bem supremo - o Homicídio.

É por esta compreensão do "eu", que chego à compreensão do outro.

Tanto porque entendo porque não faço, como porque entendo porque seria capaz de fazer.

O Inferno para quem tem de decidir da vida do outro, é realmente estar fechado ao outro.

Toda a cultura ocidental me impunha uma caminhada a sós. Mas não é esta a forma correcta de estar no mundo e de Ser.

Nasço habitada pelos outros. Não me mutilem.

Eu não sou a fonte de nada.

O Juiz não é medida de nada , nem o centro de nada.

O Juiz é um conjunto de experiências próprias e uma compreensão das experiências alheias.

É um confronto constante com um avanço pessoal cujo estofo é um passado comum mas também individual. Quanto mais sólido for esse estofo, mais seguro e independente será o percurso.

Ao Juiz é-lhe exigido que exerça a cidadania pelo exemplo , pelo culto de virtudes, como aos Samurais , até ao ultimo Samurai e com a pureza da Sakura.

(...) Na Idade Média, no período da guerra civil, a brevidade da vida da flor da cerejeira, impressionou muito os japoneses que sentiam que tinham a vida constantemente ameaçada. Além disso, ela, às vezes, foi comparada com os guerreiros- Samurai, que deviam dar a sua vida a qualquer momento em que fosse necessário. A vida do samurai era tão efémera como a da flor da cerejeira. Assim, essa flor- sakura- ficou ligada à imagem do samurai, tornando-se de facto numa metáfora da morte corajosa e pura para os japoneses.

A coragem, a dignidade, o serviço ao outro desinteressadamente e em função dos outros, o rigor formal na expressão do seu ponto de vista , o sentido da estética no exercício da sua profissão, uma forma de estar serena e humilde mas altiva na dignidade e de exercer a sua função, o sentido da hierarquização dos valores, a sabedoria de entender o outro por mais diferente que seja, a coragem de contrariar a sua própria tendência para ser igual na hora de ser diferente.