"Luz e lata" discorre na onda do tempo. Ontem fui a uma tertúlia. E muito aprendi, antes, durante e depois dela. Este tipo de reuniões familiares voltaram. Diz a Wikipedia que "a tertúlia é na sua essência uma reunião de amigos, familiares ou simplesmente frequentadores de um local, que se reúnem de forma mais ou menos regular, para discutir vários temas e assuntos." E continua : "Historicamente em Portugal o Chiado, dado o grande número de cafés aí existentes, assumiu a liderança em número de tertúlias. A Brasileira, o Nicola e outros receberam tertúlias com participantes tão influentes como Bocage, Alexandre Herculano, António Feliciano de Castilho, Almada Negreiros, Eduardo Viana, António Botto, Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro ou Stuart Carvalhais entre outros. No Porto o Majestic, a Brasileira e o Guarany, eram os locais por excelência onde se reuniam intelectuais, artistas,políticos. Coimbra, Faro, na realidade qualquer cidade ou vila de Portugal, tinham nos seus cafés tertúlias, onde se discutia tanto a política nacional ou internacional, o futebol ou o mais recente mexerico da terra."
Eu gosto muito de tertúlias porque gosto muito das pessoas. Não é só por deformação profissional, acontece que gosto mesmo de "trocar" razões. Há pessoas que têm mais "razões" que outras, mas não é por isso que valem mais que as outras. Agora, as "razões", essas sim: há umas que valem mais. Temos "pena", Eça é que é Eça.
O fenómeno tem-se espalhado e as pessoas reúnem-se em torno de um livro, um filme, uma figura pública, projectos, ideias, pessoas comuns. Pequenos encontros para conversas que podem ser "grandes" . No fundo andamos fartos dos circos: dos múltiplos "parlamentos", que de "parla" e de "mentar", nullius! Fartinhos de vias lácteas que brilham, mas não tiram a fome, nem aquecem os corações. As pequenas luzes bruxuleantes de que fala Jorge de Sena.
Aristóteles começa a sua "Metafísica" com uma afirmação, que se mantem verdade: "todos os homens desejam naturalmente saber". As tertúlias, quando o são, contribuem para satisfazer essa fome. Ao que dizem os dicionários, a palavra teve origem em Espanha no século XVII. Nesse tempo era hábito ler e comentar as obras de Tertuliano (164-245 d.c.). Os seus sermões eram considerados "três" vezes melhores que os de Marco Túlio Cícero (106-43 a.c), e por isso o chamavam Ter Túlio. Já hoje: cadê elas? Mas elas "mesmo"? Quem trabalha para chamar as coisas pelos nomes que elas têm? A sério, sem joguinhos, quem é? O facebook - que não deixa de ser uma tertúlia - pergunta-me: o que estás a pensar? Mas porque não me diz também "ele" o que está a pensar? Porque é que só me pergunta? Porque não nos diz "ele" o que pensa? O que sente? Nullius.
Neste admirável mundo novo, onde em cada esquina, ou junto a cada quartel de bombeiros (ver imagem), nascem encontros, tudo vale, e mais a pena, porque a alma não é pequena. Nesse trabalho, para além das muitas tertúlias em que participei, já me encontrei a tertuliar em conversas ainda mais informais que as ditas cujas. No fundo, a vida é uma ter-túlia ambulante. Recomeça sempre, e sem ser preciso "sair de casa". É que a grande tertúlia começa "em nós", que quando nos encontramos estamos cheios de material, e o material, como sabemos, tem sempre razão. Só que a gente esquece esse melhor argumento.