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NOS Primavera Sound: Beck veio para fazer a festa mas faltou carinho ao reencontro

No primeiro concerto que deu em Portugal em quase 15 anos, Beck apostou num alinhamento repleto de êxitos, revisitados de forma fugaz. Com poucas exceções, o público do festival do Porto reagiu com relativa frieza

Beck no Primavera Sound de Barcelona, Espanha
Xavi Torrent/Getty

Um dos nomes fortes da segunda noite de festival, Beck veio ao NOS Primavera Sound fazer a festa mas, apesar da sucessão de êxitos que apresentou, o entusiasmo do público (muito numeroso) nunca se espalhou de forma generalizada, contribuindo para a impressão de um concerto a meio gás. É difícil perceber a razão do sucedido: talvez o formato da atuação, com Beck acompanhado por dois músicos algo escondidos na penumbra, não tenha ajudado. É possível, também, que a memória coletiva não tenha guardado com alta fidelidade canções como 'New Pollution' ou 'Mixed Bizness', que se esperaria terem sido recebidas com maior emoção. A verdade é que, à exceção de meia-dúzia de temas, a plateia foi assistindo com atenção, mas de forma passiva, a um concerto no qual seria expectável haver uma maior participação popular.

Vestido de fato branco e camisa escura, Beck David Hansen, que não se deixou fotografar, calcorreou em permanência o palco, no qual parecia, num primeiro relance, estar sozinho. Saltitando de tema em tema, o californiano detinha-se pouco tempo em cada canção; a 'Mixed Bizness', do álbum "Midnite Vultures", que em 1999 foi descrito como o seu "disco Prince", seguiam-se 'New Pollution' e outros clássicos de "Odelay" (1996), o trabalho que lhe valeu maior popularidade. No mesmo fôlego, passava "a correr" por 'Up All Night' ou 'Dear Life', de 2017, naquilo que às tantas parecia ser um concerto de homenagem a si mesmo. Não que a auto-reverência não se justificasse: particularmente discreto entre discos, e mesmo quando os lança, Beck não está nas bocas do mundo a todo o momento, mas é oportuno lembrar que foi da sua mente inquieta que saiu uma porção muito generosa de música inspirada e eclética, da pop mais freak dos anos 90 à fase singer-songwriter, passando pelo funk 'principesco' e demais atalhos pela rota da música popular.

Esta noite, porém, o registo best of em modo zapping não conquistou grande simpatia por parte do público. Insistindo em tratar os espectadores por gueros e guerolitas (calão hispânico para brancos), Beck só quebrou a relativa frieza da plateia em momentos muito específicos: a relativamente recente 'Up All Night' foi uma das canções mais bem recebidas e a sequência em que, munido de uma guitarra acústica, revisitou a faceta de cantautor com 'Lost Cause', de "Sea Change" (2002), e 'Morning', de "Morning Phase" (2014), mereceu mais aplausos do que as 'senhoras' que a haviam antecedido. Repescada à banda-sonora do filme "O Despertar da Mente" - aquele cujos protagonistas preferem apagar a memória da felicidade que viveram, por já não conseguirem repeti-la -, a bonita versão de 'Everybody's Got To Learn Sometime', dos Korgis, também brilhou um pouco acima das outras 'estrelas', afagando a costela melancólica da plateia.

"Há muito tempo que não vínhamos a Portugal!", exclamou a certa altura Beck. Talvez se tenha passado demasiado tempo desde essa última visita (no Super Bock Super Rock, em Lisboa há 14 anos) e a relação com o público nacional tenha, consequentemente, esfriado. Ainda assim, um grande êxito é um grande êxito, e quando os primeiros segundos de 'Loser' ecoaram no Parque da Cidade, os telemóveis ergueram-se para registar o regresso àquele momento de 1994 que mudou muita coisa na pop e tudo na vida de Beck. Entusiasmado com a prova de vida dos fãs, o norte-americano prolongou a canção com prazer, tendo o mesmo sucedido com 'Where It's At', recebida, ao nosso lado, com gritos de "é esta! É agora!". Terá sido a falta de carinho a impedir que, ao contrário do que aconteceu nesta reta final, as outras canções crescessem além de uma brevidade que parecia pensada para a reduzida capacidade de atenção da era das redes sociais? A verdade é que, cerca de 70 minutos depois de entrar em palco, Beck acabou por se despedir do público que não via desde 2008 sem pedidos de encore (ou, como os descreveu uma espectadora, sem "festinhas no ego"), o que não deixou de causar alguma surpresa.

A imprensa não foi autorizada a captar imagens no concerto de Beck, o que lamentamos. Por essa razão não é possível apresentar a habitual fotogaleria