Blitz

Promotores, músicos e fãs felizes com fim das máscaras nos concertos. “Vemo-nos em palco, saudades dos vossos sorrisos!”

Dois anos depois, cai a obrigatoriedade do uso de máscara nos concertos. À BLTZ, promotores de concertos, músicos e espetadores são unânimes na alegria com que acolhem a decisão, para alguns “tardia”. Fernando Ribeiro (Moonspell), Lena d’Água, Selma Uamusse, António Zambujo e Tó Trips; e Álvaro Covões (NOS Alive), João Carvalho (Voadafone Paredes de Coura) e Karla Campos (EDP Cool Jazz), entre outros, dão a sua opinião

EDP Cool Jazz, Concerto de James, Fernando Ribeiro, Tó Trips, António Zambujo, NOS Alive, Selma Uamusse, Lena d'Água e Vodafone Paredes de Coura
Rita Carmo (exceto 1ª foto)

Desde a passada sexta-feira, 22 de abril, que o uso de máscara é obrigatório apenas em transportes públicos, hospitais e lares de idosos. Libertos desta imposição ficam assim os concertos, onde nos últimos meses se assistia já, de resto, a um certo relaxamento. A BLITZ ouviu promotores de espetáculos, músicos e fãs e encontrou um ambiente de alegria com o regresso à “normalidade” e aos afetos. O verão que aí vem, com o regresso dos grandes festivais, é também visto com grande otimismo pelos seus protagonistas.

“25 meses após o início da pandemia, finalmente a normalidade”, congratula-se Álvaro Covões, diretor da Everything Is New, que organiza grandes eventos como o festival NOS Alive. “Usufruir de um espetáculo sem máscara torna a experiência muito mais interessante”, considera o também dirigente da APEFE (Associação de Promotores de Espetáculos, Festivais e Eventos). “Este verão será marcado pelo regresso dos festivais e a nossa expectativa é muito elevada”, assume, lembrando que a edição deste ano do NOS Alive, que acontece em julho, no Passeio Marítimo de Algés, será a primeira desde 2019. “Para muitos, será o seu primeiro festival.”

Igualmente confiante está João Carvalho, diretor do Vodafone Paredes de Coura. “Claro que nunca podemos esquecer tudo o que vivemos e perdemos nos últimos dois anos, mas o fim das máscaras é um vislumbre da normalidade e daquilo que vivíamos antes da pandemia. Pelo que tem sido noticiado, acredito que não seja necessário implementar quaisquer medidas restritivas e que o regresso ao anfiteatro natural [do Taboão] seja, finalmente, feito com naturalidade — sem máscara e sem distanciamento social. É o regresso ao afeto, à proximidade de quem nos é querido, ao abraço, ao sorriso, à descontração e à leveza de aproveitar o momento.”

João Carvalho lembra, porém, um “problema: o grande desafio é fazer acontecer festivais com tudo mais caro. Não aumentamos os preços dos bilhetes, mas a mão de obra e todas as infraestruturas aumentaram em média 30%, isto depois de dois anos a perder dinheiro.”

O concerto dos James no Campo Pequeno, no dia em que caiu a obrigatoriedade das máscaras
Rita Carmo

Por seu turno, Karla Campos, responsável por festivais como o ID No Limits, que se realizou em fevereiro, ou do EDP Cool Jazz, que regressa em julho a Cascais, mostra-se feliz com a medida “libertadora. Não fazia sentido continuar como estávamos, uma vez que temos um índice de vacinação tão elevado”, diz, ressalvando que “o uso de máscara estava a valer para eventos indoor. No ID No Limits, em fevereiro, foi muito difícil obrigar o público a permanecer com a máscara colocada. Para [beber] tinham de a tirar, e depois acabavam por não a pôr de volta”, lembra. A promotora considera que é “um alívio” poder ver as pessoas “cara a cara, sorriso a sorriso. Voltar a abraçar e beijar os amigos vai ser muito bom!”, completa, falando dos “sinais de retoma” percetíveis nesta área.

James no Campo Pequeno, Lisboa, a 22 de abril de 2022
Rita Carmo

Igualmente satisfeitos com o fim das máscaras nos concertos manifestaram-se vários músicos. Para Fernando Ribeiro, vocalista dos Moonspell, esta foi uma medida “arrancada a ferros, que peca por tardia e que, na prática, já se verificava em concertos com plateia em pé. Eu estou feliz com tudo isto e espero que exista a coragem de se manter este caminho. Em tempos de guerra, de peste, de controlo e desigualdade, nunca a música foi essencial para regenerar e entreter um público tão maltratado e desafiado por este mundo em tons de fim. Vemo-nos em palco, saudades dos vossos sorrisos!”, despede-se.

Também Selma Uamusse apontou que, apesar de habitualmente se dizer que “os olhos são o espelho da alma”, a pandemia serviu para “constatar que não são apenas os olhos. A nossa empatia também passa por todo o contacto visual, na íntegra. Espero que o fim das máscaras represente não só o regresso a uma vida normal, como um contacto mais próximo entre músicos e público. Mas não nos podemos esquecer de todas as dificuldades que passámos enquanto profissionais da música”, alerta. “Que esta liberdade possa representar, também, um não esquecimento da fragilidade pela qual tantos e tantas passaram.” A cantora acredita estarmos perante “um novo começo, uma nova página de que todos estamos a precisar”, marcados por uma maior compreensão e comunicação.

Quem já atuou ao vivo na “era” sem máscaras foi Lena d’Água, que a 25 de Abril voltou ao Porto, onde não tocava há vários anos, para um concerto do ciclo Cultura em Expansão, em Cedofeita. “Foi tão maravilhoso”, emociona-se. “Quando entrei em palco e vi aqueles sorrisos todos, o meu sorriso triplicou! Nestes últimos dois anos, fomos sempre tocando, graças ao [álbum de 2019] ‘Desalmadamente’, e este foi o concerto mais fixe que fizemos”, diz, contando que a assistir ao mesmo estavam “crianças pequeninas e senhoras sexagenárias”, uma das quais lhe ofereceu um leque. “Estava toda a gente a cantar, a dançar, com os braços no ar! Foi lindo voltar finalmente a cantar no Porto, num sítio lindo de morrer”, remata Lena d’Água.

Igualmente entusiasmado, Tó Trips defende que o fim das máscaras “representa o afastar deste clima assético de frieza! Que bom é, dois anos depois, estar em palco e voltar a ver rostos! A maior expressão humana, sem estar escondida atrás de uma máscara. É bom estarmos juntos em liberdade.”

António Zambujo vê esta medida “como mais uma prova de que estamos a vencer a pandemia e como um alívio para quem assiste aos espetáculos, porque eu fui assistir a alguns e custou-me muito ter que estar com a máscara durante duas horas”, confessa. “Desde a abertura das salas — primeiro com 50% [da capacidade], depois com 75% e depois na totalidade —, o que sinto é que as pessoas adoram ir a concertos e sentiam imensa falta de música ao vivo. Tanto quanto nós.”

Idles no Coliseu de Lisboa, em março

Para quem assiste aos concertos, o fim da obrigatoriedade das máscaras é também uma boa notícia. Alexandra Silva, de 42 anos, nunca deixou de ir a espetáculos durante a pandemia, mas está “entusiasmada por poder fazer chegar o calor desta voz aos artistas. E também por poder vibrar mais com o coletivo.” A fã de música ao vivo, que vive em Lisboa, lembra que, num dos últimos concertos a que assistiu — o dos ingleses Idles, no Coliseu de Lisboa —, “parte do entusiasmo coletivo veio também dessa libertação das gargantas, das expressões vocais e necessariamente das faciais. Caindo a máscara, cairão algumas barreiras”, acredita. Ainda que alguns espectadores possam optar por continuar a usar máscara, Alexandra Silva crê que quem gosta de entoar bem alto as letras dos artistas “vai estar certamente mais solto”.

Também Raquel Segadães, de 29 anos, continuou a ir a concertos nos últimos dois anos. “Na maioria dos casos, mesmo ainda antes de haver vacina, senti-me segura”, diz a jovem natural do Porto. “Acho que a espontaneidade e liberdade de movimentos já começaram a surgir há algum tempo, de forma natural. As pessoas estão cansadas das máscaras, da distância e das regras. Mesmo assim, acredito que [o fim das máscaras traga] um sentimento maior de liberdade entre as pessoas que até agora cumpriram sempre as regras.”

Para Patrícia Moreira, de 43 anos, as medidas tomadas nos últimos dois anos, pelos promotores de espetáculos, permitiram aos fãs "usufruir da arte de uma forma extremamente segura. Continuei a ir a concertos e sempre me senti muito mais segura numa sala de espectáculos do que noutro lugar qualquer." Entusiasmada com o fim da obrigatoriedade das máscaras, a melómana da Batalha lembra que "cada um continua a ser livre de usá-las se isso contribuir para que se sinta mais seguro", mas acredita que, sem elas, os espectadores "poderão reagir de forma mais livre à música que estão a ouvir. Será certamente uma plateia menos passiva, menos controlada."