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A reafirmação do Brasileirão

Deixemo-nos de fintas. O rótulo de brinca na areia decalcado de qualquer jogador brasileiro ainda subsiste, mas  vírgulas letras à parte, o futebol do Brasil tem sofrido mudanças que o tornam atractivo por outras razões. Luís Freitas Lobo analisa-as.

Manuel Tinoco de Faria (www.expresso.pt)

De fundos de investimento, transmissões televisivas, novas contratações, formatos de competição a patrocínios, o Expresso analisa à lupa o Campeonato Brasileiro de Futebol.

O Brasileirão, ou o campeonato que consagra o campeão brasileiro absoluto, tem início marcado para o dia 8 de Maio. Por esta altura, disputam-se os dezanove estaduais. Os mais conhecidos? O Paulistão e o Carioca

O contingente paulista faz-se representar pelo Santos, São Paulo, Palmeiras e Corinthians (estes dois últimos conhecidos como os italianos). A equipa onde brilhou Pelé comanda, após 14 rodadas, o campeonato estadual paulista.

O exército carioca responde com o Mengão - ou o Flamengo, campeão Brasileiro em título e que se orgulha de ter a maior base de adeptos do Mundo - o Fluminense, o Botafogo e o regressado Vasco da Gama, vencedor da Série B na época transacta.

O Clube de Regatas Flamengo, fundado para disputas de remo em 1895, lidera o Grupo A da Taça Rio, o estadual carioca. O Botafogo vai na frente do Grupo B e no próximo dia 28 há derby da zona Sul na "cidade maravilhosa".

Há ainda outro estadual que tem dado cartas no país do "futebol e carnaval". Falamos do Gauchão, também dividido em dois grupos, ou 'chaves'. Na Chave 1, encontramos o Internacional no comando. Na Chave 2, um desconhecido S. José de Porto Alegre partilha o primeiro posto com o Grémio

Competitividade proveniente do Rio Grande do Sul

O Brasileirão deve um acréscimo de competitividade ao estadual do Rio Grande do Sul, que tem "clubes fortes, casos do Grémio, Internacional e do Cruzeiro". Estes intrometeram-se entre a disputa paulista e carioca devido ao "modelo dos pontos corridos, recentemente adoptado no campeonato brasileiro", afirma Freitas Lobo.

"Não havia muitas oportunidades para os clubes menores. Com o desaparecimento do modelo por grupos, a eliminar, ao estilo das competições europeias, surgiram outras equipas capazes de lutar pelo título". Foi o berço do Brasileirão nos moldes actuais, corria o ano de 2003, era Campeão do Mundo de Selecções... o Brasil.

O último vencedor do extinto 'Campeonato Brasileiro - Série A' foi o Santos, que derrotou o rival paulista Corinthians a duas mãos (5-2). Um ano depois, o primeiro título do Brasileirão fugia para Belo Horizonte, com o Cruzeiro a fazer época memorável (cerca de 100 pontos em 46 jogos, já que em ano 'experimental' o campeonato acolheu vinte e quatro equipas). 

Vinte equipas, trinta e quatro jornadas

Hoje jogam vinte equipas em trinta e quatro jornadas. Existem quatro vagas para a Copa Libertadores (a Champions League do hemisfério sul), oito para a Sulamericana (equivalente à Euro League) e quatro onde nenhuma equipa deseja terminar, a chamada zona de rebaixamento

Para o comentador português, a reformatação do campeonato "aumentou a competitividade, logo, o futebol tornou-se mais apelativo".

Basta olhar para o Brasileirão da época passada. Na última jornada, não houve máquinas de calcular que chegassem para os responsáveis do Flamengo, Internacional e do São Paulo. Por último, sorriram os cariocas com o nono título do seu historial.

Já outros cariocas estiveram perto de chorar, ficando um ponto acima da linha de água. Falamos do Fluminense. Que ficou a um ponto de outro clube do Rio, o Botafogo. Ambos estiveram na corda bomba, mas mantêm-se no principal escalão.

Este ano espera-se igual competitividade num campeonato de emoções fortes. O futebol de dez dos vinte e seis estados do Brasil vai ser posto à prova. 

Freitas Lobo é fã do futebol paulista

Luís Freitas Lobo é fã confesso do futebol paulista pois considera-o mais evoluído: "o futebol carioca é mais atractivo porque tem mais fintas. O paulista para mim faz o balanço perfeito entre a criatividade típica dos brasileiros com um rigor táctico invulgar no futebol sul-americano".

Já que falamos de táctica, falemos de treinadores. Não há nenhum técnico estrangeiro a trabalhar no Brasil. Porquê? "Acho que é o que falta para o futebol daquele país. Ideias novas. Alguém que inove, traga outra mentalidade. O que não falta no Brasil é matéria-prima para excelentes equipas".

É precisamente a matéria-prima que tem ajudado o Brasil a impôr-se na economia mundial. O país respira saúde financeira e, por consequência, os clubes de futebol apresentam estabilidade, podendo arriscar no mercado internacional, algo contra-natura para um Futebol tendencialmente exportador.

Robinho de volta ao Brasil

Veja-se o caso de Robinho. "Um jogador que vive acima do seu clube no Brasil e que na Europa não sentiu o mesmo", na opinião de Freitas Lobo. Está de regresso ao Santos, por empréstimo do Manchester City. Quer apenas minutos para se mostrar a Dunga?

Freitas Lobo não tem dúvidas: "Claro que a imprensa brasileira vai 'empurrá-lo' para o Mundial. Ser um ídolo da torcida de um clube no Brasil não é como ser um símbolo de um grande clube europeu. Ali é o Robinho e mais dez. Isso faz com que os brasileiros retornados ao seu futebol se sintam confortáveis, em casa. Porque na Europa não chegam a este patamar de idolatração".

O comentador acha que, em termos televisivos, o futebol brasileiro é um excelente produto de exportação: "a própria cobertura jornalística é única no Mundo, os jogadores são entrevistados em pleno relvado, antes, no intervalo, e depois dos jogos".

"Há várias particularidades, algumas curiosas, como vários jogos dos estaduais onde os adeptos invadem o campo... antes do começo. Chegam a atrasar meia-hora o início do jogo!", conta.

E a violência, no relvado ou nos próprios estádios, tantas vezes transmitida nas televisões no lugar de resumos de jogos de cartaz do Brasileirão, por exemplo?

"A notícia já não é só essa. Isso depende das nossas televisões. Eu, pessoalmente, acho o campeonato argentino mais violento. É uma competição bem mais perigosa e bem menos apelativa a novos patrocinadores", garante.

Fundos de investimento

Freitas Lobo desenvolve o tema e refere um ponto que tentámos não perder de vista, no meio do emergente e mais competitivo futebol praticado no país que vai receber, nos próximos seis anos, duas competições de peso: o Campeonato do Mundo de Futebol (2014) e os Jogos Olímpicos (2016).

Falamos dos fundos de investimento: "É lamentável, mas no Brasil, onde encontramos talento debaixo de pedras, há clubes que vivem deles. Funcionam como plataformas giratórias. Os Ipatingas, os Corinthians Alagoanos, de onde partiu o nosso Deco..."

"História mal contada..."

"Eu olho para o Lulinha do Estoril, 19 anos, falei dele há dois anos no Mundial de sub-17... Onde é que o Estoril-Praia tem condições para ir comprar uma promessa do Corinthians?!", insurge-se.

O jovem avançado não é caso isolado em Portugal, que aproveita as novas possibilidades de um mercado onde nem tudo é claro entre clubes, empresários e atletas.

"Não viste o Tiago Luís, que entrou no final do jogo Benfica-Leiria? Pois eu vi-o, seis quilos mais gordo, ali perdido, ele que também esteve nesse Mundial sub-17. Óbvio que há ali muita história mal contada..." sugere.

Ainda assim, o futebol do país irmão apresenta-se de cara lavada. Porém, não há bela sem senão: "Os clubes ainda têm a mania de comprar veteranos. O Marcelinho Paraíba. O Juninho Paulista, enfim...". E estrangeiros?

"É sabido que no Brasil só resultou o Petkovic. É um intocável. Ele que andou pelo Real Madrid. Encontrou consolo no Flamengo!"

Show de bola

Com excelentes assistências nos Estádios - "é raro ver jogos com menos de vinte, trinta mil pessoas" - com novos reforços - o mais sonante será Robinho, o mais surpreendente talvez Vágner Love -, equipas mais competitivas e uma Selecção pujante e democrática - Dunga carimbou o passaporte antes da hora para a África do Sul e deu oportunidade a vários jogadores do Brasileirão de jogarem pelo escrete - os clubes brasileiros jogam hoje um campeonato mais atractivo e apetecível para os fãs de futebol de todo o Mundo. 

Eis a lista das vinte equipas que vão disputar o Brasileirão 2010:

  1. Atlético (Minas Gerais)
  2. Atlético (Paraná)
  3. Atlético (Goiás)
  4. Avaí (Santa Catarina)
  5. Botafogo (Rio de Janeiro)
  6. Ceará (Ceará)
  7. Corinthians (São Paulo)
  8. Cruzeiro (Rio Grande do Sul)
  9. Flamengo (Rio de Janeiro)
  10. Fluminense (Rio de Janeiro)
  11. Goiás
  12. Grémio (Rio Grande do Sul)
  13. Barueri (São Paulo)
  14. Guarani (São Paulo)
  15. Internacional (Rio Grande do Sul)
  16. Palmeiras (São Paulo)
  17. Santos (São Paulo)
  18. São Paulo
  19. Vasco da Gama (Rio de Janeiro)
  20. Vitória (Bahia)
É show de bola mesmo.