Um ano de transição
Mudanças no sector do livro abrandaram, por causa da crise, mas devem continuar em 2010.
Depois do alvoroço provocado em 2008 pelo aparecimento da LeYa, o processo de transformação da paisagem editorial portuguesa desacelerou este ano, devido à crise económica. Embora o sector do livro seja um dos que tradicionalmente resiste melhor aos períodos de recessão, as dificuldades transversais (como as relativas à obtenção de créditos bancários) acabaram por deixar as suas marcas, visíveis nos cortes generalizados dos planos editoriais (que passaram a contar com menos novidades e mais reedições ou recapagens), na quebra significativa tanto das vendas como das tiragens, no fechar de portas de uma livraria clássica de Lisboa (a Buchholz, que teve o mesmo destino da Byblos, um ano antes) e na falência de algumas editoras, como a Campo das Letras e a Quasi.
Curiosamente, os recentes sinais de retoma também se fizeram acompanhar por algumas boas notícias, como o facto de a Cavalo de Ferro ter renascido das cinzas (após um conturbado e abortado processo de integração no universo empresarial da Fundação Agostinho Fernandes) e o surgimento de novas pequenas editoras estimulantes, como a Ahab, a Estrofes & Versos ou a LxXL.
Por outro lado, os últimos meses do ano deixam entender que o processo de concentração está de novo em marcha, desde logo com a criação de um novo grupo - Babel - que reúne as duas editoras já detidas por Paulo Teixeira Pinto (Guimarães e Ática) e as duas que o empresário adquiriu recentemente (Verbo e Ulisseia). A grande incógnita de 2010, porém, é o destino dos activos portugueses da Bertelsmann, que o gigante alemão se mostra disponível para vender a curto prazo. Quando se sabe que os referidos activos abrangem o Círculo de Leitores mais um núcleo de quatro editoras (Bertrand, Quetzal, Pergaminho, Temas e Debates) e a maior rede de livrarias do país (Bertrand), parece evidente que o negócio em causa vai alterar por completo o equilíbrio de forças no mercado livreiro em Portugal.
Num ano pródigo em livros com potencial para conquistar o primeiro lugar dos tops (Miguel Sousa Tavares, Margarida Rebelo Pinto, José Rodrigues dos Santos, Ricardo Araújo Pereira; além dos consagrados António Lobo Antunes e José Saramago), Rodrigues dos Santos afirmou-se de vez como o rei dos best-sellers, ao vender mais de 150 mil exemplares de "Fúria Divina" (Gradiva) em poucas semanas, ultrapassando a barreira do milhão de exemplares vendidos de toda a sua obra.
A uma escala mais modesta, registe-se ainda o sucesso comercial de "2666", de Roberto Bolaño (melhor livro do ano para a redacção do "Actual", feito o somatório das escolhas de cada um dos colaboradores da secção Livros), com cerca de 23 mil exemplares vendidos. José Mário Silva
Uma espécie de esperanto
No mundo globalizado do livro, a literatura nacional é irrelevante.
Um olhar panorâmico sobre a nossa paisagem editorial e o modo como ela é reflectida publicamente nos espaços impressos ou audiovisuais dedicados a livros leva-nos a uma conclusão sobre a qual importa reflectir, porque as suas consequências são bem visíveis: cada vez mais, a bolsa de valores literários tem uma dimensão internacional e, para ela, já pouco conta a tradição das literaturas nacionais. Em termos pragmáticos, isto traduz-se da seguinte maneira: a circulação transnacional de produtos editoriais, nomeadamente uma world fiction de fácil, rápida e larga difusão, abafa e reduz o espaço (de edição, de comercialização, de divulgação e crítica) outrora dedicado à literatura nacional. Entre nós, com a concentração da edição em grandes grupos, este dado é hoje de uma enorme evidência. A pouco e pouco, tudo o que faz parte da literatura nacional é remetido para uma quase clandestinidade, em todas as instâncias. Veja-se, por exemplo, como esse 'género' jornalístico tradicional que é a entrevista ao escritor deve a sua sobrevivência, quase exclusivamente, às entrevistas a escritores estrangeiros. Ou - o que significa o mesmo - concentrou-se nos dois escritores nacionais que estão cotados nessa bolsa internacional de valores literários: António Lobo Antunes e José Saramago. As grandes figuras do internacionalismo literário têm todo o caminho aberto: quem é que, fora dos EUA, se vai aplicar a dizer que, por exemplo, os livros de Philip Roth são desde há muito tempo bastante medíocres, se tudo está preparado para fazer de mais uma tradução de um livro seu um grande acontecimento literário? O que pode, contra mais um Philip Roth, um ensaio como o de Manuel Gusmão sobre "Finisterra", de Carlos de Oliveira, no ano em que esse grande romance da literatura portuguesa cumpriu o seu 20º aniversário? Fazer parte deste espaço literário mundial poderia encher-nos de felicidade e de convicções cosmopolitas se as coisas neste campo de uma "economia espiritual" (como dizia Valéry) não fossem mais complicadas que as da economia material. A verdade é que dificilmente (por razões que não podem ser aqui descritas e analisadas) podemos prescindir da referência à literatura nacional (pensemos, desde logo, neste aspecto: o índice de intraduzibilidade, as resistências internas que um texto oferece para transpor as fronteiras da sua língua, é um valor). O modelo da globalização transposto para os modos de circulação da literatura é uma máquina de rasurar. António Guerreiro
Nada de especialmente novo no Reino das Letras. Os 'velhos' continuam a dar cartas, algumas vindas de além-túmulo (republicações, compilações ou novas traduções mantêm-se um valor seguro). Exemplo: saiu na Presença mais uma edição de "O Monte dos Vendavais". É possível escrever melhor sobre a tragédia do amor? Não (com espaço explicaria melhor...). Além disso, tivemos Roth, Cormac, Musil, tivemos Jean Améry, Bolaño e Cortázar com fartura. De que nos podemos queixar? De não ter aparecido escriba (luso) que iguale o Cardoso Pires ou a Maria Velho da Costa? Pois bem, "ainda não é o fim nem o princípio do mundo, calma, é apenas um pouco tarde". E se os tempos não serão muito interessantes, como diz um provérbio russo, viver numa época interessante é algo que não se deseja nem ao pior inimigo.
A Consciência de Zeno
Italo Svevo
Dom Quixote
A Segunda Guerra Mundial
Martin Gilbert
Dom Quixote
A Volta ao Dia em 80 Mundos
Julio Cortázar
Cavalo de Ferro
As Meninas da Numídia
Mohamed Leftah
Quetzal
Atentar Contra Si. Discurso Sobre a Morte Voluntária
Jean Améry
Assírio & Alvim
Na Cova dos Leões
Tomás da Fonseca
Antígona
Obra Poética Completa
Edgar Allan Poe
Tinta da China
Os Desaparecidos
Daniel Mendelsohn
Dom Quixote
Suttree
Cormac McCarthy
Relógio D'Água
2666
Roberto Bolaño
Quetzal
Duas antologias de poesia portuguesa são certamente os livros mais discutíveis do ano (mais discutíveis do que discutidos). A de Manuel de Freitas é uma antologia de tendência e, quer queira quer não, incide no cânone; a de Jorge Reis-Sá e Rui Lage é panorâmica, inclusiva e didáctica. No que diz respeito à poesia, destaque-se o livro póstumo de Nuno Rocha Morais, que nos revelou um poeta de grande dimensão. Ainda no plano dos livros que nos convidam a olhar para o nosso cânone literário, importa referir o ensaio de Manuel Gusmão sobre "Finisterra", de Carlos de Oliveira, porque este romance continua a ser uma espécie de objecto não identificado no nosso planeta literário, um lugar de resistência como o são os livros de Maria Gabriela Llansol, cujo espólio começou agora a ser editado.
A Montanha Mágica
Thomas Mann
Dom Quixote
Os Cantos de Maldoror. Poesias I e II
Lautréamont
Antígona
Uma Data em Cada Mão. Livro de horas I
Maria Gabriela Llansol
Assírio & Alvim
Caim
José Saramago
Caminho
Últimos poemas
Nuno Rocha Morais
Quasi
Mar Largo
Vítor Nogueira
& etc
Poemas portugueses...
Jorge-Reis Sá e Rui Lage
Porto Editora
A Perspectiva da morte: 20 (-2) Poetas...
Manuel de Freitas
Assírio & Alvim
Ensaio sobre o Termo da História
António Vieira
Fim de Século
Finisterra. O Trabalho do Fim: Recitar a Origem
Manuel Gusmão
Angelus Novus
Ainda a reter: no ano Poe, "Todos os Contos" (Quetzal/Círculo) e "Poesia Completa" (Tinta da China), além de "Poe", biografia de Peter Ackroyd (Saída de Emergência). A tradução de "A Montanha Mágica", de Thomas Mann, dois Don DeLillo, as reedições de "A Obra ao Negro", de M. Yourcenar, e "Conversa na Catedral", de M.V. Llosa (ambos na Dom Quixote). Ainda: "Nocturnos", de K. Ishiguro (Gradiva), "Invisível", de Paul Auster, e "O Relatório de Brodeck", de P. Claudel (ambos na ASA), "Perguntem ao Pó", de John Fante (Ahab), e "O Dia Antes da Felicidade", de Erri de Luca (Bertrand). E boa poesia: "Poesia Cubana Contemporânea" (Antígona), "Ruba'IYat", de Umar-I Khayyam, "O Amor Chegou com as Chuvas", de Mirabai, "O Livro de Horas", de R.M. Rilke, e "Escolhido pelas Estrelas", de Z. Herbert (todos na Assírio & Alvim).
Escritos Secretos
Sebastian Barry
Bertrand
O Sindicato dos Polícias Iídiches
Michael Chabon
Casa das Letras
Darwinia
Robert Charles Wilson
Saída de Emergência
A Lebre de Vatanen
Arto Paasilinna
Relógio D'Água
Elegia para um Americano
Siri Hustvedt
ASA
Entrevistas da "Paris Review"
Tinta da China
Antologia da Poesia Grega Clássica
AAVV
Portugália
Milton
William Blake
Antígona
A Confiança em Si
Ralph Waldo Emerson
Relógio D'Água
Grandes Tradições Religiosas
Karen Armstrong
Temas e Debates/Círculo de Leitores
O problema com as listas de 'melhores do ano' nunca está no que se escolhe, mas no que se é forçado a deixar de fora. Da colheita de 2009, bastante boa (sem ser vintage), destaco ainda dois excelentes primeiros romances: o de Junot Díaz ("A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao") e o de Mohammed Hanif ("O Caso das Mangas Explosivas"), ambos da Porto Editora; o picaresco "Caim", de José Saramago (Caminho), infelizmente mais discutido do que lido; "A Música da Fome", de J.M.G. Le Clézio (Dom Quixote); "O Mundo", de Juan José Millás (Planeta); "A Rainha no Palácio das Correntes de Ar", de Stieg Larsson (Oceanos); "A Ofensa", de Ricardo Menéndez Salmón (Porto Editora); a estreia romanesca de José Carlos Barros, "O Prazer, o Tédio" (Oficina do Livro), e a lúdica "Enciclopédia de História Universal", de Afonso Cruz (Quetzal).
2666
Roberto Bolaño
Quetzal
Os Cadernos de Pickwick
Charles Dickens
Tinta da China
Netherland - Terra de Sombras
Joseph O'Neill
Bertrand
O Leilão do Lote 49
Thomas Pynchon
Relógio D'Água
Os Desaparecidos
Daniel Mendelsohn
Dom Quixote
Últimos Poemas
Nuno Rocha Morais
Quasi
Um Caçador de Leões
Olivier Rolin
Sextante
Pergunta ao Pó
John Fante
Ahab
Leite Derramado
Chico Buarque
Dom Quixote
A Ilha
Giani Stuparich
Ahab
Uma vez mais se confirma que o livro, com a sua generosa relação entre custo e horas de prazer, tem capacidade para resistir à crise. As editoras portuguesas com qualidade, que não são raras, lançaram um elevado número de obras interessantes em boa parte das áreas. Por vezes não foram as maiores a fazê-lo, como se vê por um exemplo como o da Bizâncio, cujo catálogo alia diversidade e coerência em áreas por vezes negligenciadas. Com ou sem distribuição própria, as editoras continuam a enfrentar condições de mercado difíceis (nomeadamente quanto às margens), e o leitor português tem de apreciar o esforço. Uma ou outra editora de referência em crise, uma livraria de prestígio que fecha, a entrada em força de uma editora externa, algum progresso nos e-readers são factos adicionais que completam a rotina.
A Pedra da Lua
Wilkie Collins
Relógio D'Água
2666
Roberto Bolaño
Quetzal
A Evolução para Todos
David Sloan Wilson
Gradiva
Vem Aí a República
Joaquim R. Magalhães
Almedina
O Passeio do Bêbado
Leonard Mlodinow
Bizâncio
História Universal da Destruição dos Livros
Fernando Baez
Texto Editora
Crash 1929
John Kenneth Galbraith
Gestão Plus
No Bosque do Espelho
Alberto Manguel
Dom Quixote
Revolução 1989 - A Queda do Império Soviético
Victor Sebestyen
Presença
O Sindicato dos Polícias Iídiches
Michael Chabon
Casa das Letras
O Ano de 2009 foi profícuo para o mundo da edição. Já nos vamos habituando, de ano para ano, a este paradoxo que faz com que aos lamentos da comunidade de editores corresponda uma proliferação de publicações portuguesas e traduzidas. Mas a verdade é que se a leitura continua a não ser uma das principais opções de lazer em Portugal, já a aposta em públicos mais jovens, o incremento da idade de ensino obrigatório e o aumento exponencial da frequência do ensino superior tinha de fazer - e fez - o seu caminho. Mas será que esse facto significa algo mais? Talvez não, mas duas circunstâncias jogam a favor do meu optimismo: o enorme salto dado pela comunicação escrita (mesmo que seja em blogues, no Twitter ou no Facebook) e o babyboom da nova geração de escritores portugueses.
O Prazer - Memórias Desarrumadas
Miguel Graça Moura
Verso da Kapa
A Evolução a Duas Vozes
Carreira das Neves e Teresa Avelar
Bertrand
Os Anagramas de Varsóvia
Richard Zimler
Oceanos
Os Passos da Cruz
Nuno Júdice
Dom Quixote
O Mar em Casablanca
Francisco José Viegas
Porto Editora
Breviário das Almas
Joaquim Mestre
Oficina do Livro
A Dama Negra da Ilha dos Escravos
Ana Cristina Silva
Presença
O Milionário de Lisboa
José Norton
Livros d'Hoje
O Gato de Uppsala
Cristina Carvalho
Sextante
O Cão das Ilhas
Maria Conceição Caleiro
Sextante
Num ano menos espectacular em novidades traduzidas do que 2008, os destaques foram quase todos reedições: Mann, Svevo, Dickens, Pynchon, DeLillo e Amis. João Barrento e a Dom Quixote continuaram o seu santo trabalho musiliano, desta vez com uma espécie de bootleg de "O Homem sem Qualidades". Os vampiros anexaram as tabelas de vendas, e a fanfarra mediática em torno da publicação do romance póstumo de Bolaño proporcionou a algumas almas independentes a oportunidade de se munirem de alho e água benta e fazerem o sinal da cruz à unanimidade. Mesmo não correspondendo às expectativas criadas pelo imenso talento do autor, "2666" não deixa de ser um dos pontos altos de 2009. Ponto ainda mais alto foi "A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao", para mim, o romance do ano.
A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao
Junot Díaz
Porto Editora
A Consciência de Zeno
Italo Svevo
Dom Quixote
2666
Roberto Bolaño
Quetzal
Money e/ou London Fields
Martin Amis
Teorema
O Leilão do Lote 49
Thomas Pynchon
Relógio D'Água
Ruído Branco
Don DeLillo
Sextante
Roubo
Peter Carey
Dom Quixote
O Resto é Ruído
Alex Ross
Casa das Letras
O Século XX Esquecido
Tony Judt
Edições 70
Revolutionary Road
Richard Yates
Civilização
A avalancha de novas edições, invadindo o mercado nacional, continua a um ritmo alucinante. Todavia, este é pequeno e a crise está aí para durar, sendo tolos aqueles que acreditam que a recuperação pode ser tirada da cartola. Calcula-se que a nível global, a cada 30 segundos, um novo livro é colocado à venda. Mas, se fizermos as contas, 20 por cento da população adulta mundial não sabe ler nem escrever e mais de 60 por cento não tem dinheiro para comprar um livro nem vida para o ler. Por cá, 18 por cento dos portugueses vivem abaixo do limiar da pobreza e ainda existe um milhão de analfabetos. Os bons títulos escasseiam, os maus abundam, e a máquina continua a bombar. Tudo no nosso mercado do livro está cada vez mais parecido a uma Dona Branca, ou pior, a um "Bernie" Madoff. O tempo o dirá...
Outras Vozes, Outros Lugares
Truman Capote
Sextante
O Caso das Mangas Explosivas
Mohammed Hanif
Porto Editora
2666
Roberto Bolaño
Quetzal
Campo de Sangue
Dulce Maria Cardoso
ASA
Se Numa Noite de Inverno um Viajante
Italo Calvino
Teorema
A Volta ao Dia em 80 Mundos
Julio Cortázar
Cavalo de Ferro
Invisível
Paul Auster
ASA
Auto-retrato...
Haruki Murakami
Casa das Letras
A Sombra do que Fomos
Luis Sepúlveda
Porto Editora
Conversa n'A Catedral
Mario Vargas Llosa
Dom Quixote