O Tribunal de São João Novo, Porto, condenou hoje um dos jovens envolvidos no caso Gisberta a oito meses de prisão efectiva por omissão de auxílio ao transexual.
O colectivo presidido pelo juiz João Grilo decidiu que o arguido Vítor S. poderá cumprir a pena em prisão domiciliária, se assim o entender.
A pena aplicada - o máximo permitido para aquele crime praticado por jovens - são descontados dois meses e cinco dias de prisão preventiva que Vítor S. já cumpriu.
A advogada do jovem, Patrícia Castiajo, disse que "em princípio" vai recorrer, mas acrescentou que a decisão final fica dependente de uma reunião que vai ter com o arguido.
O Ministério Público fica obrigado a recorrer, já que pedira uma pena inferior à aplicada.
Nas alegações finais, a procuradora Maria José Fernandes pediu que o jovem fosse condenado a acompanhar o trabalho de uma instituição de apoio aos sem-abrigo, todas as sexta-feiras, durante meio ano, em alternativa ao cumprimento de meio ano de prisão.
Críticas aos depoimentos
Na leitura do acórdão, o magistrado João Grilo criticou os testemunhos dos jovens que também estiveram envolvidos no caso, e que já tinham sido condenados no Tribunal de Família e Menores do Porto.
"Impreciso", "vago", "omisso", "desconexo" foram expressões usadas pelo juiz para classificar os testemunhos.
Tiveram "memória selectiva", lembrando-se de tudo, menos do envolvimento do arguido nos factos, referiu o magistrado.
"Míngua de prova"
O tribunal "não acreditou nos menores, mas o certo é que, "face à míngua de prova" "não foi possível apurar a actuação concreta do Vítor" no que toca a eventuais agressões a Gisberta, lamentou.
Já quanto à omissão de auxílio, a "atitude covarde" ficou provada, segundo o magistrado.
João Grilo lamentou as desculpas invocadas pelo arguido para não pedir auxílio para o transexual em agonia, que oscilaram entre o receio de que as culpas recaíssem apenas em si e o pensar que a ambulância não poderia entrar no local onde se encontrava.
A culpa de Vítor é, neste aspecto, "intensa" e "merecedora de censura ética elevadíssima" até porque deixou passar vários episódios de agressão, sem promover o socorro da vítima.
"Divertir a ver sofrer"
Para o tribunal, em causa está, neste processo, a atitude de um grupo de jovens "que se divertia a ver alguém sofrer", um acto de "crueldade inimaginável", pelo que "não é possível suspender a pena ou substitui-la".
O juiz-presidente lamentou que Vítor assistisse impávido ao "definhar de um ser humano" motivado por uma "agressão selvática e desumana".
Ao comentar a pena aplicada, o magistrado referiu outros casos de violência envolvendo jovens como o da suposta agressão de uma aluna da Escola Secundária Carolina Michaelis à sua professora ou de estudantes norte-americanos que agrediram selvaticamente colegas de turma.
Vítor S., actualmente com 18 anos, começou a ser julgado no início de Fevereiro sob a acusação de ter colaborado em 2006 com 13 adolescentes, já julgados e condenados em tribunal de menores, por maus-tratos a Gisberto Júnior, um brasileiro sem-abrigo e doente em fase terminal, que viria a morrer afogado no fosso para onde foi atirado pelos menores.