1. São Luís
Estado do Maranhão
Ficou conhecida, até hoje, como a "Cidade dos Azulejos". Em São Luís, no remoto estado do Maranhão, o marquês de Pombal planeava criar uma nova Lisboa no Equador; por isso, mandou abrir ruas e calçadas, sistemas de canalização e de esgotos. Muitos casarões do centro histórico ainda datam dessa época de prosperidade económica, em que Pombal, com a sua visão mercantilista, levou para o Maranhão a produção de arroz e algodão em larga escala - não sem antes ter expulso os jesuítas, reforçado o tráfico de escravos e incentivado as migrações de portugueses, em particular de açorianos.
Mais próxima de Lisboa que do Rio de Janeiro, São Luís era um tradicional reduto português. Servida por porto, a cidade tinha intensas trocas comerciais com a metrópole, e era em Portugal que estudavam os filhos dos comerciantes ricos. "Independência ou morte!" - o grito do Ipiranga, lançado por D. Pedro em 1822, que deu origem à independência do Brasil, tardou em fazer eco no Maranhão, cujas elites agrícolas estavam fortemente ligadas aos interesses da Coroa. O Maranhão era então uma das mais ricas regiões do Brasil. O reverso negro era a mão-de-obra dos escravos, enviados em remessas para alimentar a produção de arroz e algodão, tão incentivada por Pombal.
Com os franceses, e mais tarde com os holandeses, Portugal teve de batalhar pela posse do território. Liderados por Daniel de La Touche, Senhor de La Ravardière, os franceses invadiram São Luís em 1612, com o objectivo firme de aí fundar um núcleo da França Equinocial. Em menor número e menos artilhados, os portugueses conseguiram em 1615 expulsar as tropas do bravo Senhor de La Ravardière. Reza a lenda que foram ajudados pela aparição da Virgem, cujas mãos milagrosas transformaram a areia em pólvora e os seixos em projécteis, dando-lhes as munições que lhes faltavam.
Considerada Património da Humanidade pela UNESCO, a capital do Maranhão é hoje uma simbiose de culturas e de influências coloniais. Além dos azulejos, os portugueses deixaram outras marcas, como o sarrabulho e a dobradinha. Mas nem tudo eram rosas. O padre António Vieira, que viveu dez anos no Maranhão numa espécie de exílio, deixou um sermão acutilante: "A verdade que vos digo é que no Maranhão não há verdade."
2. Paraty
Estado do Rio de Janeiro
Era do porto de Paraty que se embarcavam para Lisboa toneladas de ouro e diamantes do Brasil, que fizeram a glória de Portugal no século XVIII e ajudaram a construir grandes monumentos, como o Convento de Mafra. As riquezas vinham carregadas de burro desde Minas Gerais, pela Estrada Real, que a Coroa mandou abrir para o transporte da preciosa carga.
Por Paraty passaram milhares de portugueses que abandonaram o reino atraídos pela corrida ao ouro. Era lá que havia o único caminho de acesso à fonte das riquezas. A Coroa portuguesa controlava ferozmente o fluxo de ouro e pedras preciosas, proibindo o seu transporte sem ser pela Estrada Real. Em 1703, para proteger o caminho do ouro do ataque de piratas, foram construídas em Paraty duas fortalezas.
Com o ouro, fixou-se muita gente em Paraty, comerciantes e sobretudo funcionários públicos, para garantir o funcionamento de quartéis, postos de fiscalização e da Casa do Quinto. Aqui, o ouro era pesado, fundido até ser reduzido a barras, arrecadando-se um quinto do seu valor como imposto para o erário régio.
Mas o ouro foi sol de pouca dura em Paraty. O monopólio do transporte através do seu porto foi de apenas 15 anos, já que em 1710 foi aberto um caminho directamente do Rio de Janeiro para as "minas gerais". A trilha de burros onde antes circulava o ouro passou a servir para escoar a produção dos "barões do café". Com o ciclo do café, a partir do século XIX, a cidade reviveu tempos de glória. Mas acabou votada a um isolamento que, ironicamente, ajudou a preservar até hoje o seu charme colonial. Já em 1501, na sua missão de explorar a recém-descoberta costa do Brasil ao serviço do Rei D. Manuel I, Amerigo Vespucci tinha ficado rendido à beleza natural de Paraty. Para a História, ficou o desabafo emocionado do navegador florentino: "Oh, Deus, se na terra houvesse um paraíso, não seria muito longe daqui."
3. Salvador
Estado da Bahia
Foi num estado deplorável que a família real chegou a Salvador, em Janeiro de 1808, fugindo às tropas francesas de Junot que tinham invadido Lisboa. Visivelmente agastada com a viagem, a princesa Carlota Joaquina desembarcou de turbante na cabeça. Disfarçava assim o facto de estar careca, devido à infestação de piolhos na nau onde seguia. Mas as fogosas baianas, que assistiam com alvoroço à chegada dos reis portugueses, viram ali uma moda que se apressaram a copiar.
D. João VI, conhecido por estar sempre de bolsos untados com os franguinhos que comia vorazmente, deixou saudades na capital da Bahia. Simbolicamente, era o estado do Brasil onde Pedro Álvares Cabral tinha chegado em 1500 e que durante dois séculos e meio fora a capital da colónia. No decorrer da escala de um mês em Salvador (para restaurar as naus dos estragos das tempestades), até se instalar no Rio de Janeiro, D. João VI selou ali actos importantes. Além de determinar a abertura dos portos brasileiros, decidiu fundar em Salvador a primeira escola de medicina do Brasil, criar uma companhia de seguros e uma série de fábricas. Fez ainda um plano de fortificação da Bahia, integrando a construção de 25 canhoeiras.
Desde que em 1549 foi declarada capital do Brasil pela Coroa portuguesa, Salvador tornou-se no maior centro urbano a sul do Equador - e também no maior porto de entrada de escravos africanos no Brasil.
Salvador perdeu o título de capital para o Rio de Janeiro em 1763. Mas manteve a riqueza da diversidade humana e de culturas que a tornou num dos mais interessantes exemplos da miscigenação brasileira. Forçados a louvar os santos católicos, os escravos fundiram-nos com deuses africanos. Se Salvador apregoa ter 365 igrejas, uma para cada dia do ano, muitas delas, como a do Bonfim, são hoje frequentadas indistintamente por católicos e seguidores de candomblé.
4. Olinda
Estado do Pernambuco
"Ó linda terra para se construir uma vila" - terá dito o fidalgo português Duarte Coelho ao chegar à povoação do Nordeste que os índios chamavam de Marim. O fidalgo andava à procura de um sítio para se instalar, após tomar posse da sua capitania do Pernambuco, em 1535, na sequência do regime hereditário instituído pela Coroa portuguesa.
Foi amor à primeira vista, e o nome ficou. Olinda, banhada pelo mar, com um porto natural formado por recifes, terras férteis em redor - e no alto de colinas, onde era mais fácil combater os invasores -, afigurava-se como o local ideal para Duarte Coelho fundar o seu império.
O Pernambuco acabou por tornar-se numa das mais ricas capitanias portuguesas no Brasil, graças ao sucesso das plantações de cana-de-açúcar. Foram tempos em que Olinda, então a capital, respirava luxo e ostentação.
Com a missão de catequizar os índios e garantir a conquista definitiva das terras, as ordens religiosas começaram a chegar a Olinda por volta de 1580. Primeiro foram carmelitas, seguindo-se jesuítas, franciscanos e beneditinos. Mas os esforços dos
Os holandeses invadiram Olinda em 1630 e um ano depois incendiaram a cidade, instalando a capital no Recife. Foram expulsos em 1654, mas Olinda acabou por ficar em segundo plano - apesar da dura luta travada em 1710 pelos pernambucanos proprietários de engenhos, que viam com maus olhos a prosperidade do Recife, onde residiam os comerciantes portugueses, os "mascates". Após o incêndio dos holandeses, os conventos foram reconstruídos com igual esplendor, e a cidade é hoje Património da UNESCO. Mas só com o seu exuberante Carnaval é que Olinda consegue reviver os tempos de glória que conheceu no passado.
5. Ouro Preto
Estado de Minas Gerais
A aventura dos bandeirantes paulistas, descendentes de portugueses, tinha por destino esse lugar onde fora descoberta uma estranha pedra preta - que, afinal, se revelou ser ouro. A pé, desbravando a mata com facões e resistindo a indígenas canibais, conseguiram chegar em 1695, após uma longa marcha desde São Paulo, à terra que hoje se chama Ouro Preto.
A descoberta do ouro acabou por mudar o rumo da História de Portugal e do Brasil no século XVIII. Era de Minas Gerais, um estado brasileiro do tamanho da França, que vinha o ouro e as pedras preciosas que alimentaram o fausto da Corte. Ouro Preto, capital de Minas no período mais florescente do ciclo do ouro, permanece hoje uma memória viva desse Portugal de esplendor, com as suas igrejas barrocas e o casario colonial. Em Ouro Preto nasceu o mestre Aleijadinho, filho de um arquitecto português e de uma escrava africana, cuja obra traduz a exuberância de então. Além de Ouro Preto, Minas Gerais tem mais de uma centena de cidades históricas, como São João d'El Rey, Mariana, ou Diamantina, onde a presença portuguesa é marcante.
Apesar do declínio da produção de ouro no final do século, a Coroa portuguesa continuava a carregar nos impostos. Um clima de revolta foi-se adensando entre as elites de Minas, que conspiravam secretamente pela criação de um estado independente. Com a célebre "Inconfidência Mineira", acabou por ser enforcado Tiradentes, que ficou para a História como um herói-mártir do Brasil.
Diz-se que o temperamento reservado dos mineiros se deve à necessidade de esconder o ouro que lhes ficou gravada na alma. Carlos Drummond de Andrade, também mineiro, exprime-o em poema: "Só mineiros sabem. E não dizem a si mesmos o irrevelável segredo chamado Minas."
Texto publicado na Única da edição do Expresso de 11 de Outubro de 2008