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"A História é uma relação com o público"

O modo de construção desta "História de Portugal" que o Expresso vai oferecer a partir do próximo sábado é aqui explicado por Rui Ramos, coordenador desta obra em nove volumes, cuja autoria conta ainda com Bernardo Vasconcelos e Nuno Monteiro.

Alexandra Carita e Henrique Monteiro (www.expresso.pt)

Porque é que precisávamos de uma nova "História de Portugal"? Este livro foi uma encomenda da Esfera dos Livros, que me pediu que formasse uma equipa para escrever uma síntese da História de Portugal num só volume. Aceitei por duas razões. A primeira tem que ver com o facto de a História ter mudado muito nos últimos 20 ou 30 anos. Há muito mais gente a fazer História, e a fazê-la de outra maneira, com outros contactos, nomeadamente internacionais, o que deu uma natureza diferente ao trabalho, muito mais académico. Mas também se tinha transformado num sentido negativo, tinha-se tornado muito monográfica, muito especializada, fazendo com que a maior parte das produções se tivesse tornado inacessível ao público. Ora, a História é a relação com o público. E era preciso voltar a estabelecer essa relação com o público.

Concretamente, em que é que esta "História" é diferente das outras? É diferente a começar por aí. Não havia um equivalente a ela. A mais aproximada a este modelo é a "História" de Oliveira Marques, que foi concebida em 1972, e aquela outra mais pequenina, "A História Concisa de Portugal" de José Hermano Saraiva, que data de 1978. O que havia eram atas de congressos, artigos fora do alcance do comum das pessoas e depois aquelas "Histórias" em vários volumes publicadas a partir da década de 80 e durante os anos 90, dirigidas por José Mattoso, João Medina, e também a "Nova História de Portugal" dirigida por Oliveira Marques e Joel Serrão. Portanto, era tudo estantes. Aquilo de que precisávamos neste momento era de um só volume, para um público culto poder ter um contacto com a História mais manuseável e ao mesmo fazer face à necessidade de síntese que nós, historiadores, sentimos para perceber qual é a nossa visão.

Nas investigações que fizeram, alguma vez se depararam com o facto de o passado se tornar imprevisível? Como trabalho de síntese, a feitura desta "História" não assentava em investigação original. Mas essa síntese, baseada na maior parte da produção historiográfica das últimas décadas, traz surpresas, sobretudo de ênfases, de opções. Creio que haverá para o leitor algumas surpresas, sobretudo para o que não acompanha a produção universitária, mas também para os autores, pois com o nosso trabalho de composição fomos obrigados a olhar de uma maneira diferente para determinados momentos, figuras e acontecimentos.

É um trabalho mais interpretativo? Sim. Tinha de ser uma síntese interpretativa, não íamos limitar-nos a, através de tesoura e cola, colecionar uma espécie de antologia daquilo que os outros escreveram. Tanto eu como o Bernardo Vasconcelos e o Nuno Monteiro tivemos sempre a noção de que isto é uma História de Portugal, nós próprios podíamos ter escrito outra, completamente diferente. Temos consciência de que isto é uma solução para contar a História de Portugal. Há outras.

Rui Ramos

Investigador principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, onde ensina nos cursos de mestrado em Política Comparada e de doutoramento em Ciência Política, e professor convidado na Universidade Católica Portuguesa. Licenciado em História pela Universidade Nova e doutorado em Ciência Política pela Universidade de Oxford, é autor dos livros "A Segunda Fundação (1890-1926)", "João Franco e o Fracasso do Reformismo Liberal" e "D. Carlos". Mantém uma coluna de comentário da atualidade no Expresso.

Nuno Gonçalo Monteiro

Investigador coordenador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e professor convidado do ISCTE. Doutorado em História Moderna pela Universidade Nova e agregado em História pelo ISCTE. Entre as suas publicações contam-se "O Crepúsculo dos Grandes - A Casa e o Património da Aristocracia em Portugal (1750-1834)", "D. José - Na Sombra de Pombal" e "Elites e Poder - Entre o Antigo Regime e o Liberalismo".

Bernardo Vasconcelos e Sousa

Professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova, onde tem lecionado no âmbito da licenciatura e do mestrado em História Medieval e de cujo Instituto de Estudos Medievais foi presidente. Entre as suas publicações destacam-se "Os Pimentéis - Percursos de Uma Linhagem da Nobreza Medieval Portuguesa (Séculos XIII-XIV)" e "D. Afonso IV (1291-1357)". Coordenou a obra "Ordens Religiosas em Portugal".